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ToggleO conceito de posse vem definido no art. 1.196 do CC/02, โconsidera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercรญcio, pleno ou nรฃo, de algum dos poderes inerentes ร propriedadeโ.
No Direito, existem inรบmeras teorias que tentam explicar a posse.
Abaixo, vou pontuar algumas delas.
A primeira, bastante estudada na academia, รฉ a teoria subjetiva da posse.
Elaborada por Friedrich Carl von Savigny, esta teoria aponta que a relaรงรฃo de posse dependerรก de 2 elementos:
- Animus;
- Corpus.
Antes de prosseguir, veja nosso vรญdeo desenhado (abaixo) sobre o conceito de posse.
animus รฉ a intenรงรฃo de ter a coisa como sua.
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Trata-se, portanto, de um elemento subjetivo.
Em paralelo, o corpus รฉ a apreensรฃo fรญsica da coisa.
Nรฃo se trata de contato fรญsico, mas sim de estar na esfera de controle do indivรญduo.
Essa teoria sofre algumas crรญticas e, ao menos em tese, nรฃo pode ser aplicada com precisรฃo no Direito Brasileiro.
Isso porque essa teoria inviabiliza o conceito de posse direta (art. 1.197 do CC/02).
Como veremos mais adiante, a posse direta nasce com a transmissรฃo temporรกria da posse.
Por exemplo, o locador transfere a posse, temporariamente, para o locatรกrio (vide lei 8245).
Neste exemplo, o locatรกrio รฉ o possuidor direto, ao passo que o locador รฉ o possuidor indireto.
O possuidor direto รฉ aquele que detรฉm a posse direta da coisa.
Observe que, neste exemplo, o locatรกrio tem posse, mas nรฃo tem intenรงรฃo de ter a coisa como sua, logo, nรฃo tem animus.
Por isso, a teoria subjetiva da posse encontra obstรกculo na prรณpria legislaรงรฃo.
A segunda teoria, tambรฉm muito estudada nas universidades, รฉ a teoria objetiva da posse.
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Posse (Direito Civil) – Resumo Completo
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Elaborada por Rudolf von Ihering, esclarece que a relaรงรฃo possessรณria decorre de uma exteriorizaรงรฃo de controle que um indivรญduo exerce.
Note que, diferente de Savigny, que se apega a um aspecto subjetivo (a intenรงรฃoโฆ), Ihering apega-se a um fato objetivo (a exteriorizaรงรฃo de controleโฆ).
Por isso, a teoria de Ihering รฉ conhecida como teoria objetiva da posse.
Essa รฉ a teoria adotada pelo Cรณdigo Civil, na medida em que, alรฉm de nรฃo afastar o conceito de posse direta e indireta, tambรฉm justifica o instituto da detenรงรฃo.
Observe que o conceito de posse definido pelo Cรณdigo Civil impรตe o exercรญcio de fato (objetivo), pleno ou nรฃo, de algum dos poderes inerentes a propriedade (art. 1.196 do CC/02).
O detentor, contudo, tem relaรงรฃo de dependรชncia com outra pessoa e apenas conserva a posse em nome deste (art. 1.198 do CC/02).
ร o caso, por exemplo, do caseiro que trabalha em uma determinada fazenda.Essas sรฃo as duas teorias mais conhecidas.
Porรฉm, hรก outras igualmente importantes no estudo da posse.
A primeira teoria bastante debatida no direito รฉ a teoria social da posse.
Elaborada por Silvio Perozzi, essa teoria explica que a posse รฉ legitimida pela sociedade por uma conduta geral de abstenรงรฃo.
Observe que, diferente das demais, a teoria social da posse define a posse como um fenรดmeno social.
A posse, entรฃo, seria um produto da sociedade.
Tal abstenรงรฃo social em relaรงรฃo a posse รฉ que justifica a plena disposiรงรฃo de fato de uma coisa.
Raymond Saleilles, por usa vez, elaborou a teoria da apreensรฃo econรดmica da posse.
A posse, nesta teoria, depende de interesse econรดmico, consciรชncia social, do incentivo social.
De forma direta e didรกtica, podemos afirmar que essa teoria disciplina que a posse pode recair, apenas, sobre o bem que permite apreensรฃo econรดmica.
O conceito de posse, entรฃo, guarda relaรงรฃo com aquilo que รฉ passรญvel de apropriaรงรฃo econรดmica.
Para parcela da doutrina, essa teoria foi adotada pelo nosso ordenamento jurรญrico, nos termos do art. 1.228 do Cรณdigo Civil:
Art. 1.228. O proprietรกrio tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavรช-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. ยง 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonรขncia com as suas finalidades econรดmicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilรญbrio ecolรณgico e o patrimรดnio histรณrico e artรญstico, bem como evitada a poluiรงรฃo do ar e das รกguas.(โฆ)Cรณdigo Civil
Essa teoria, como se observa, justifica o conceito de funรงรฃo social da posse.
Por fim, podemos ainda falar da teoria da funรงรฃo social da posse, elaborada por Antonio Hernรกndez Gil.
Segundo esta teoria, a posse รฉ uma relaรงรฃo que compรตe a estrutura do Estado, logo, sua concretizaรงรฃo depende do respeito a programas por ele estabelecidos.
ร o caso, por exemplo, da funรงรฃo social da posse de propriedade rural (art. 186 do CF/88).
Caso a parte nรฃo cumpra sua parte, o Estado pode retirar a posse.
Em relaรงรฃo ao tem, interessante observar que, segundo o enunciado 492 da V jornada de direito civil, โa posse constitui direito autรดnomo em relaรงรฃo ร propriedade e deve expressar o aproveitamento dos bens para o alcance de interesses existenciais, econรดmicos e sociais merecedores de tutelaโ.
Isso significa que o possuidor deve cumprir sua funรงรฃo social.
Trata-se de um desdobramento da concepรงรฃo existencialista da Constituiรงรฃo.
Diante desse cenรกrio, podemos concluir que o justo tรญtulo pode perder espaรงo diante da possuidor que, ainda que nรฃo proprietรกrio, cumpre a funรงรฃo social da propriedade.
Trata-se da usucapiรฃo.
E maisโฆ
O prรณprio Estado pode, diante do desrespeito ร funรงรฃo social, desapropriar o imรณvel.
Falamos, aqui, em desapropriaรงรฃo por interesse social (lei 4132/62).
Interessante observar que tanto a usucapiรฃo, como a desapropriaรงรฃo sรฃo formas de aquisiรงรฃo originรกria da propriedade (e nรฃo derivadaโฆ).
Isso significa que ambas decorrem de um fato jurรญdico que permite a aquisiรงรฃo da propriedade sem qualquer รดnus ou gravame.
Tambรฉm nรฃo hรก recolhimento de impostos.
A aquisiรงรฃo originรกria nรฃo depende da manifestaรงรฃo da vontade, bastando demonstrar que a parte preencheu os requisitos legais.
Feita essa anรกlise e compreendido o conceito de posse, hรก outras questรตes que tambรฉm merecem atenรงรฃo.
Veremos, mais adiante, que os direitos reais, segundo grande parte da doutrina, apresentam-se em rol taxativo.
Em outras palavras, o direito real precisa estar disciplinado pela lei.
Evidente que nรฃo precisa estar apenas no art. 1.225 do CC/02.
ร possรญvel encontrar outras hipรณteses na legislaรงรฃo como รฉ o caso, por exemplo, a propriedade fiduciรกria do imรณvel (art. 33 da Lei 9.514/97).
Em relaรงรฃo ao conceito, ainda, Flรกvio Tartuce ensina que posse รฉ a exteriorizaรงรฃo da propriedade e o possuidor tem o poder de fato, ao passo que o proprietรกrio o poder de direito (TARTUCE, Flรกvio. Cรณdigo Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudรชncia. Forense: Rio de Janeiro. 2019. versรฃo Kindle. p. 854).
O primeiro seria um estado de fato provisรณrio e o segundo um poder de direito definitivo.
A relaรงรฃo de poder, neste cenรกrio, depende da percepรงรฃo externa que, por sua vez, vincula-se a ideia de domรญnio.
Considerando que รฉ necessรกrio externalizar um poder sobre a coisa, podemos concluir que apenas bens corpรณreos podem ser objeto de posse.
Note que bens incorpรณreos (e.g. direitos autorais) podem ser objeto de propriedade, mas nรฃo de posse.
Qual รฉ a natureza jurรญdica da posse?
Entenda a natureza jurรญdica da posse com nosso vรญdeo desenhado (abaixo).
Podemos apontar 3 correntes em relaรงรฃo ao tema.
A primeira delas sustenta que a posse รฉ um fato jurรญdico.
O grande problema, segundo alguns doutriadores, รฉ que o direito nรฃo tutela fato jurรญdico.
No Brasil, contudo, hรก forte proteรงรฃo da posse, motivo pelo qual tal corrente nรฃo se sustenta.
A segunda corrente, entende que a posse รฉ um direito e, por isso, recebe tutela jurรญdica.
A quarta corrente, por sua vez, respalda-se na teoria tridimensional do direito.
Segundo essa teoria, direito รฉ fato, valor e norma.
A terceira corrente defende que a posse tem natureza jurรญdica de direito real.
Sobre o tema, Flรกvio Tartuce ensina, com inegรกvel brilhantismo, o seguinte:
โA posse, importante fato social, possui natureza jurรญdica de direito real por incidir sobre coisa determinada, ser dotada de eficรกcia contra todos e contar com o exercรญcio direto, isto รฉ, sem intermediรกrios, como sucede nos direitos pessoais, prestacionais por excelรชncia. Como se nรฃo bastasse, ainda รฉ o instituto que inaugura o estudo dos direitos reais. Estes argumentos parecem convencer de que, a despeito da omissรฃo legislativa, a posse รฉ um direito real.โ(TARTUCE, Flรกvio. Cรณdigo Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudรชncia. Forense: Rio de Janeiro. 2019. versรฃo Kindle. p. 854)
Classificaรงรฃo da posse
Posse direta e posse indireta
Hรก inรบmeras classificaรงรตes relacionadas ao instituto da posse.
Quanto ao exercรญcio, a posse poderรก ser direta ou indireta.
Segundo esta classificaรงรฃo, frente ร transmissรฃo temporรกria da posse, nasce o possuidor direto e o possuidor indireto.
O conceito pode ser extraรญdo a partir da leitura do art. 1.197 do CC/02:
โart. 1.197. A posse direta, de pessoa que tem a coisa em seu poder, temporariamente, em virtude de direito pessoal, ou real, nรฃo anula a indireta, de quem aquela foi havida, podendo o possuidor direto defender a sua posse contra o indireto.โCรณdigo Civil
O possuidor direto, entรฃo, รฉ aquele que tem a coisa em seu poder.
ร o caso, por exemplo, do locatรกrio.
Jรก o possuidor indireto รฉ aquele que, na relaรงรฃo jurรญdica que justifica a transmissรฃo temporรกria, nรฃo tem a coisa em seu poder.
O objetivo desta classificaรงรฃo รฉ a proteรงรฃo possessรณria do possuidor direto.
Isso nรฃo significa, contudo, que o possuidor indireto nรฃo possa lanรงar mรฃo das aรงรตes possessรณrias.
Poderรก, inclusive, diante da ameaรงa de esbulho ou turbaรงรฃo, ajuizar interdito proibitรณrio, vale citar:
Art. 567 do CPC. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na posse poderรก requerer ao juiz que o segure da turbaรงรฃo ou esbulho iminente, mediante mandado proibitรณrio em que se comine ao rรฉu determinada pena pecuniรกria caso transgrida o preceito.
Importante observar que qualquer espรฉcie de posse, desde que com รขnimo de ser dono, รฉ apta a ensejar a legitimidade para pleitear a usucapiรฃo de bem imรณvel, inclusive a indireta, exercida, por exemplo, pelo locador.
Entretanto, รฉ preciso lembrar que o possuidor direto nรฃo tem a intenรงรฃo de ser dono.
Por isso, como regra, o possuidor direto nรฃo pode pedir a usucapiรฃo.
Existe, contudo, a possibilidade de alterar a causa de possuir.
Essa alteraรงรฃo ode ocorrer com base em uma relaรงรฃo jurรญdica que lhe dรช suporte, ou ainda, de forma unilateral.
Imagine, por exemplo, que uma empresa trabalha dentro de um determinado imรณvel e estรก passando por uma crise financeira.
A empresa, entรฃo, para captar recurso sem precisar lanรงar mรฃo de emprรฉstimo bancรกrio vende seu imรณvel a terceiro e, ato contรญnuo, arrenda o mesmo estabelecimento.
Chamamos esse contrato, no Direito, de contrato de lease back. Trata-se de um contrato de leasing bastante especรญfico.
Na prรกtica, chamamos essa clรกusula de constituto possessรณrio (ou clรกusula constituti). Significa que aquele que possui bem em nome prรณprio passarรก a possui-lo em nome alheio.
A tรญtulo de curiosidade, o traditio brevi manu รฉ justamente o inverso, ou seja, aquele que possui bem em nome alheio e passa a possuir em nome prรณprio.
Observe que, por acordo de vontades, aquele que tinha intenรงรฃo de ser dono, deixa de ter.
Mas, no Direito, ainda existem casos de alteraรงรฃo unilateral da causa da posse.
Chamamos isso de interversรฃo da posse (ou โinterversio possessionisโ).
O instituto estรก autorizado pelo art. 1;203 do Cรณdigo Civil, vale citar:
Art. 1.203. Salvo prova em contrรกrio, entende-se manter a posse o mesmo carรกter com que foi adquirida.
Vou explicar melhor com um exemplo.
imagine, por exemplo, que Joรฃo (locador) aluga para Paulo (locatรกrio) um imรณvel.
A posse de Paulo, nesse exemplo, รฉ direta e sem qualquer intenรงรฃo de ser dono.
Ocorre que, Joรฃo (locador) morre e Paulo passa a nรฃo pagar alugueis por mais de 20 anos e, inclusive, exercendo a posse como se o bem fosse seu.
Nesse caso, รฉ possรญvel demonstrar a alteraรงรฃo unilateral da causa da posse (โinterversio possessionisโ), sendo viรกvel, em tese, postular, inclusive, pela usucapiรฃo.
Nesta hipรณtese, o possuidor direto poderia passar a ser possuidor indireto.
Respeitado os demais requisitos da usucapiรฃo, poderia, inclusive, adquirir a propriedade.
Observe que nรฃo รฉ o mero inadimplemento contratual que justifica a interversรฃo da causa da posse.
A respeito do tema, cito, abaixo, um pequeno trecho de uma decisรฃo do STJ:
โA caracterizaรงรฃo da interversรฃo da posse de manda prova robusta a respeito do animus domini, ou seja, do comportamento do indivรญduo de tal forma que demonstre de forma inequรญvoca a pre- tensรฃo dominial, nรฃo deixando dรบvidas de que passou a possuir o bem com รขnimo de dono. Em outras palavras,hรก de haver ato claro de oposiรงรฃo ao possuidor indireto, o que nรฃo restou caracterizado nos autos. A mera inadimplรชncia contratual nรฃo tem o condรฃo de modificar o carรกter da posse.โ(STJ โ AREsp: 1341026 RJ 2018/0198122-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMรO, Data de Publicaรงรฃo: DJ 05/10/2018)
Por fim, รฉ importante observar que a classificaรงรฃo da posse em direta e indireta permite a cadeia de desdobramento sucessivo.
Imagine, por exemplo, a seguinte situaรงรฃo:
- Paulo averba usufruto de um imรณvel para Joรฃo;
- Joรฃo celebra contrato de locaรงรฃo com Pedro.
- Pedro celebra contrato de sublocaรงรฃo com Davi.
Esta situaรงรฃo representa uma cadeia de desdobramento sucessivo da posse.
Observe que Joรฃo era possuidor direto e, apรณs celebrar contrato de locaรงรฃo, passa a ser possuidor indireto.
O mesmo ocorre com Pedro que deixa de ser possuidor direto ao celebrar contrato de sublocaรงรฃo com Davi.
Lembre-se que possuidor direto รฉ aquele que tem a coisa em seu poder.
Portanto, ao fim da supracitado desdobramento sucessivo da posse, apenas Davi รฉ possuidor direto.
Posse exclusiva, composse e posses paralelas
Tal classificaรงรฃo respalda-se na quantidade de titulares de uma relaรงรฃo possessรณria.
Neste cenรกrio, temos a posse exclusiva e a composse.
Na posse exclusiva existe um รบnico titular exercendo a posse sobre a coisa.Tal posse subdivide-se em:
- Posse exclusiva plena;
- Posse exclusiva parcial.
Na primeira, o titular poderรก exercer todas as faculdades inerentes ao domรญnio (art. 1.228 do CC/02), ao passo que, na segunda, exercerรก apenas alguma ou algumas das faculdades.
Na composse, contudo, mais de um titular mantรฉm a relaรงรฃo possessรณria em razรฃo da mesma causa de origem.
A composse tambรฉm subdivide-se em duas espรฉcies:
- Composse simples;
- Composse em mรฃo comum.
Na primeira, cada um dos cada um dos compossuidores exerce, sozinho, a posse sobre a coisa, desde que nรฃo exclua a posse dos demais.
ร o que define o art. 1.199 do CC/02:
โArt. 1.199. Se duas ou mais pessoas possuรญrem coisa indivisa, poderรก cada uma exercer sobre ela atos possessรณrios, contanto que nรฃo excluam os dos outros compossuidores.โ
Na segunda, contudo, o exercรญcio da posse somente รฉ possรญvel se todos os possuidores exercerem a posse em conjunto.
Hรก alguns exemplos na jurisprudรชncia.
ร o caso da posse dos herdeiros, isto รฉ, os herdeiros A, B e C sรฃo titulares em conjunto da posse e nรฃo cada herdeiro especificamente (TJ-RS โ AC: 70074799560 RS, Relator: Pedro Celso Dal Pra, Data de Julgamento: 14/09/2017, Dรฉcima Oitava Cรขmara Cรญvel, Data de Publicaรงรฃo: Diรกrio da Justiรงa do dia 21/09/2017).
Com esse entendimento, o herdeiro, sozinho, nรฃo poderia postular pela usucapiรฃo, jรก que a posse (requisito da usucapiรฃo) precisa ser exercida em conjunto.
Neste tipo de situaรงรฃo, a aquisiรงรฃo da propriedade por usucapiรฃo tambรฉm somente poderia ser buscada em conjunto.
Em outras palavras, รฉ necessรกria a composiรงรฃo subjetiva da lide por todos aqueles que possuem em comum a coisa (litisconsรณrcio ativo necessรกrio).
Por fim, podemos definir o conceito de posses paralelas.
Ocorre posses paralelas quando mais de um titular mantรฉm a relaรงรฃo possessรณria em razรฃo de causas de origem distintas sobre a mesma coisa.
Aqui, todos os possuidores podem defender a posse sem a necessidade da participaรงรฃo dos demais, salvo no caso do condomรญnio.
Posse justa e posse injusta
Segundo o art. 1.200 do CC/02, โรฉ justa a posse que nรฃo for violenta, clandestina ou precรกriaโ.
Portanto, em contraposiรงรฃo, injusta serรก a posse:
- Violenta;
- Clandestina;
- Precรกria.
A posse violenta รฉ aquela adquirida por meio de forรงa fรญsica ou moral.
Clandestina, por usa vez, รฉ a posse adquirida furtivamente, ou seja, ร s escuras.
Por fim, posse precรกria por violaรงรฃo de uma relaรงรฃo de confianรงa.
Aqui, o titular recebe a coisa com a obrigaรงรฃo de restituir, entretanto, nรฃo restitui.
Vocรช pode estar se perguntando: โmas qual รฉ a importรขncia dessa classificaรงรฃo?โ
A finalidade desta classificaรงรฃo รฉ a proteรงรฃo possessรณria.
Aquele que possui posse injustanรฃo tem direito a proteรงรฃo possessรณria.
Contudo, รฉ preciso observar que, ainda que injusta, o possuidor poderรก pleitear a usucapiรฃo extraordinรกria.
Posse de boa-fรฉ e posse de mรก-fรฉ
Esta classificaรงรฃo tem uma semelhanรงa com a anterior.
Em ambos os casos, fala-se em vรญcio na posse.
Em outras palavras, hรก vรญcio na posse injusta e na posse de mรก-fรฉ.
A diferenรงa, contudo, รฉ que, enquanto na classificaรงรฃo anterior o vรญcio ocorre durante a aquisiรงรฃo da posse, nesta o vรญcio รฉ anterior ร aquisiรงรฃo.
Desde jรก, รฉ preciso lembrar que, no Direito, presume-se a boa-fรฉ (e nรฃo a mรก-fรฉโฆ).
Portanto, de inรญcio, a boa-fรฉ da posse serรก sempre presumida.
A posse de mรก-fรฉ contem duas caracterรญsticas:
- Existรชncia de um vรญcio que impede a aquisiรงรฃo da coisa;
- Ciรชncia do vรญcio por aquele que adquire a posse.
Segundo Darcy Bessone, hรก 2 sistemas para apuraรงรฃo da boa-fรฉ:
- Sistema de fato (ou apuraรงรฃo subjetiva);
- Sistema de direito (ou apuraรงรฃo objetiva).
Enquanto o primeiro analisa a intenรงรฃo, o segundo analisa o comportamento.
O art. 1.201 do Cรณdigo Civil prevรช ambas as hipรณteses, cumpre citar:
โArt. 1.201. ร de boa-fรฉ a posse, se o possuidor ignora o vรญcio, ou o obstรกculo que impede a aquisiรงรฃo da coisa. Parรกgrafo รบnico. O possuidor com justo tรญtulo tem por si a presunรงรฃo de boa-fรฉ, salvo prova em contrรกrio, ou quando a lei expressamente nรฃo admite esta presunรงรฃo. โ
Aquele que ignora o vรญcio ou obstรกculo, em posse de boa-fรฉ, logo, apura-se a intenรงรฃo (elemento subjetivo).
A tรญtulo de curiosidade, lembro que jรก falamos aqui sobre a boa-fรฉ e a interpretaรงรฃo dos negรณcios jurรญdicos.
Em paralelo, aquele que tem justo tรญtulo tem aposse de boa-fรฉ presumida.
Segundo o enunciado 303 da IV jornada de direito civil, โconsidera-se justo tรญtulo, para a presunรงรฃo relativa da boa-fรฉ do possuidor, o justo motivo que lhe autoriza a aquisiรงรฃo derivada da posse, esteja ou nรฃo materializado em instrumento pรบblico ou particular. Compreensรฃo na perspectiva da funรงรฃo social da posse.โ
Posse velha e posse nova
Tal classificaรงรฃo respalda-se no transcurso de determinado lapso temporal para definir a posse como nova ou velha.
A posse nova รฉ a posse com menos de um ano e dia, ao passo que posse velha รฉ a que transcende esse perรญodo.
Defende-se, por meio desta classificaรงรฃo, a possibilidade de purgar os vรญcios da posse com o tempo.
O possuidor de boa-fรฉ tem direito aos frutos percebidos.
Em contrapartida, os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fรฉ devem ser restituรญdos.
Neste caso, contudo, podem ser deduzidas as despesas de produรงรฃo e custeio.
Alรฉm disso, os frutos colhidos com antecipaรงรฃo tambรฉm devem ser devolvidos.
Os frutos naturais (e.g. laranja, cafรฉ, etc) e industriais (e.g. manufaturados) reputam-se colhidos e percebidos, logo que sรฃo separados.
Os frutos civis (e.g. renda e juros), contudo, reputam-se percebidos dia por dia.
O possuidor de boa-fรฉ tambรฉm nรฃo responde pela perda ou deterioraรงรฃo da coisa, a que nรฃo der causa (art. 1.217 do CC/02).
O possuidor de boa-fรฉ, ainda, tem direito ร indenizaรงรฃo das benfeitorias necessรกrias e รบteis, bem como, quanto ร s voluptuรกrias, se nรฃo lhe forem pagas, a levantรก-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderรก exercer o direito de retenรงรฃo pelo valor das benfeitorias necessรกrias e รบteis (art. 1.219 do CC/02).
Em paralelo, o possuidor de mรก-fรฉ responde por:
- Frutos colhidos e percebidos
- Frutos que, por sua culpa, deixou de receber.
O possuidor de mรก-fรฉ, assim como o de boa-fรฉ, tem direito ร s despesas de produรงรฃo e custeio (art. 1.216 do CC/02).
Responderรก, ainda, pela perda ou deterioraรงรฃo da coisa, ainda que acidentais, exceto se comprovar que de igual modo se teriam dado, estando na posse do reivindicante (art. 1.218 do CC/02).
Quanto as benfeitorias, ao possuidor de mรก-fรฉ serรฃo ressarcidas apenas as benfeitorias necessรกrias.
Ainda assim, ante o nรฃo pagamento, nรฃo tem direito de retenรงรฃo ou direito de levantar as benfeitorias voluptuรกrias (art. 1.221 do CC/02).Quanto a indenizaรงรฃo, hรก tambรฉm um detalhe.
No caso do possuidor de mรก-fรฉ, aquele que indeniza (reivindicante) poderรก optar pelo valor atual ou seu custo.Essa opรงรฃo (faculdade) nรฃo existe em face do possuidor de boa-fรฉ.
Aqui, aquele que indeniza deverรก indenizar pelo valor atual (art. 1.222 do CC/02).
Posse natural e posse civil (ou posse jurรญdica)
A posse natural nasce, necessariamente, pelo exercรญcio de fato dos poderes da posse (art. 1.228) sobre a coisa, portanto, รฉ imprescindรญvel o corpus.
A posse civil, todavia, รฉ adquirida pela determinaรงรฃo da lei (ex. heranรงa).
Posse ad interdicta e posse ad usucapionem
A posse ad interdicta รฉ aquela que pode ser protegida por meio de aรงรตes possessรณrias, ou ainda, desforรงo imediato.
A posse ad usucapionem trata-se de modalidade de posse que autoriza a aquisiรงรฃo da posse por meio de usucapiรฃo.
Posse pro diviso e posse pro indiviso
A posse pro indiviso รฉ a posse em que os compossuidores possuem fraรงรฃo do todo.
Nasce da natureza da coisa ou da lei (ex. heranรงa).
A posse pro diviso รฉ aquela em que hรก divisรฃo de fato da relaรงรฃo possessรณria.
Posse e tรญtulo
O tรญtulo nรฃo รฉ sinรดnimo de documento.
Trata-se, em verdade, de elemento representativo da causa ou do fundamento jurรญdico de um direito.
ร preciso lembrar que, segundo o art. 1.196 do CC/02, a posse รฉ um estado de fato e nรฃo de direito, razรฃo pelo qual nรฃo se faz necessรกrio nenhum formalismo para caracterizรก-lo.
Aquisiรงรฃo da posse
A posse depende da externalizaรงรฃo de um poder de controle sobre a coisa (art. 1.196 CC/02).
Portanto, a partir do momento que รฉ possรญvel aferir que alguรฉm estรก exercendo o controle sobre a coisa, pode-se dizer que este adquiriu e tem a posse.
Para ser mais didรกtico, vou dividir os modos de aquisiรงรฃo nos prรณximos sub-tรณpicos.
Entenda o tema com um vรญdeo desenhado.
Modos originรกrios da aquisiรงรฃo da posse
Aqui, nรฃo hรก cadeia de produรงรฃo.
Em regra, hรก ato unilateral e nรฃo tem ideia de transmissรฃo negocial.
Para Orlando Gomes ainda, nรฃo hรก consentimento nesta espรฉcie de aquisiรงรฃo.
As espรฉcies sรฃo:
- Posse por apreensรฃo da coisa
- res nullius (coisa sem dono): Por exemplo, caรงar um animal para se alimentar. Este animal, tratado como coisa no Direito brasileiro, รฉ tido como espรฉcie de aquisiรงรฃo originรกria.
- res derelicta (coisa abandonada): por exemplo, pertences encontrados no lixo.
- Apreensรฃo econรดmica ou em razรฃo de violรชncia ou clandestinidade
- Aquisiรงรฃo Unilateral pelo exercรญcio do direito
ร o caso, por exemplo, da constituiรงรฃo de Direito Real em favor de outrem.
Modos derivados de aquisiรงรฃo da posse
Ao contrรกrio do anterior, o modo derivado de aquisiรงรฃo impรตe a relaรงรฃo negocial e o consentimento.
ร o caso da tradiรงรฃo.
A tradiรงรฃo รฉ entrega da coisa e poderรก ser:
- tradiรงรฃo real;
- tradiรงรฃo simbรณlica;
- tradiรงรฃo ficta.
A tradiรงรฃo real se dรก com a efetiva entrega da coisa, ao passo que a tradiรงรฃo simbรณlica se dรก por meio de um ato representativo (e.g. entrega das chaves de um imรณvel).
A tradiรงรฃo ficta, por sua vez, ocorre por presunรงรฃo.
ร o que ocorre no constituto possessรณrio e na traditio brevi manu.
Referรชncias
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