Procedimento Comum Ordinário: Inicial, Juízo de Admissibilidade e Citação (Processo Penal)

O primeiro ponto que é preciso observar é que, segundo o art. 394, § 5°, do CPP, o rito ordinário aplica-se, subsidiariamente, aos demais ritos:

Art. 394 (…)

§ 5°  Aplicam-se subsidiariamente aos procedimentos especial, sumário e sumaríssimo as disposições do procedimento ordinário.

Isso significa que o rito ordinário deve ser empregado para suprir eventuais lacunas.

Dentro do rito ordinário, tem-se as seguintes etapas;

  1. Autor apresenta Inicial Acusatória (denúncia ou queixa-crime);
  2. Juízo de admissibilidade da inicial acusatória;
  3. Citação;
  4. Réu apresenta Resposta à acusação;
  5. Julgamento Antecipado do Mérito (absolvição sumária);
  6. Não sendo absolvido, segue p/ Instrução e Julgamento;

Nos próximos tópicos vou explicar, passo a passo, essa estrutura.

Para deixar tudo mais didático, nesse artigo, vamos estudar a apresentação da inicial (1), juízo de admissibilidade (2), citação (3) e resposta a acusação (4).

Em outro artigo, vou explicar, passo a passo, o julgamento antecipado (5) e a Instrução e Julgamento (6).

Apresentação da Inicial Acusatória

Em relação a inicial acusatória, esclarece o art. 41 do CPP o seguinte:

Art. 41.  A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.

Podem ser arroladas até 8 testemunhas para cada fato criminoso sob pena de preclusão.

Tem-se entendido, contudo, que o Ministério Público pode apresentar o rol de testemunhas até a apresentação, pelo réu, da resposta a acusação, ainda que não tenha apresentado junto com a denúncia.

Esse tem sido compreendido como o prazo limite, pois, segundo a jurisprudência, na resposta à acusação inicia-se o prazo para que o réu apresente suas testemunhas (e não o MP).

Juízo de Admissibilidade da Inicial Acusatória

Após a apresentação da inicial acusatória, cabe ao juiz da instrução (e não juiz das garantias) realizar o juízo de admissibilidade da peça.

Lembro, por oportuno, que o STF alterou a redação original do art. 3°-C do CPP.

Em razão da decisão do STF, a competência do juiz das garantias NÃO cessa com o recebimento da denúncia ou queixa, mas sim com o oferecimento da denúncia ou queixa, portanto, antes do recebimento da denúncia ou queixa.

Em síntese, então, não cabe ao juiz das garantias, segundo o STF, receber a denúncia ou queixa.

Tal função foi atribuída ao juiz da instrução.

Nesse particular, o magistrado poderá:

  1. Rejeitar a inicial acusatória;
  2. Receber a inicial acusatória;

A rejeição da inicial ocorre porque a inicial acusatória não preenche os requisitos de admissibilidade.

Para impugnar essa decisão, cabe ao autor, nesse caso, interpor Recurso em Sentido Estrito (art. 581, I, do CPP) ou, se no âmbito do Juizado Especial, apelação (art. 82 da lei 9.099).

Sobre a rejeição da inicial acusatória, observe o que dispõe o art. 395 do CPP:

Art. 395.  A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I – for manifestamente inepta;

II – faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou

III – faltar justa causa para o exercício da ação penal.

A inépcia é um defeito formal grave apto a tornar incompreensível a inicial acusatória.

Também será rejeitada a inicial acusatória por ausência de:

  1. Condições da ação;
  2. Pressupostos processuais;

São condições da ação a legitimidade e o interesse processual.

Quantos os pressupostos processuais, tem-se:

  1. Pressupostos processuais de existência;
  2. Pressupostos processuais de validade;

São pressupostos processuais de existência:

  1. Demanda veiculada na inicial acusatória;
  2. Órgão jurisdicional com investidura;
  3. Partes que possam estar em juízo.

Em paralelo, são pressupostos processuais de validade:

  1. Inexistência de vícios no procedimento;
  2. Ausência de litispendência/ coisa julgada;

Por fim, a inicial acusatória será rejeitada por ausência de justa causa.

A justa causa é o lastro probatório mínimo que dá sustentação a inicial acusatória.

Além da rejeição da inicial acusatória, poderá o juiz receber a inicial acusatória.

Parte da doutrina sustenta que o ato judicial que recebe a inicial configura decisão interlocutória.

Contudo, segundo a jurisprudência, o ato judicial, aqui, não tem conteúdo decisório, sendo mero despacho.

Por isso, inclusive, estaria dispensada a fundamentação do recebimento da inicial acusatória.

Fala-se, aqui, em recebimento implícito da inicial.

Note que ambas as correntes não cabe recurso, pois:

  1. Despacho não tem conteúdo decisório e, como consequência, não cabe recurso;
  2. Decisão interlocutória desafia RESE, porém, o RESE é um recurso taxativo, cabendo apenas nas hipóteses do art. 581 do CPP. Contudo, essa hipótese (recebimento da denúncia) não tem previsão no dispositivo.

Contudo, isso não significa que é impossível impugnar a decisão que recebe a inicial acusatória.

É possível, nesse particular, impetrar Habeas Corpus.

Como consequência do recebimento da inicial acusatória:

  1. O investigado torna-se réu;
  2. Ocorre a interrupção da prescrição (art. 117, I, CP);
  3. O juízo torna-se prevento (art. 83 do CPP);

É importante destacar que, com o pacote anticrime, o juízo de admissibilidade é realizado pelo juiz das garantias (Art. 3°-B do CPP).

Entretanto, o juiz das garantias não é o mesmo juiz que julga o mérito da causa.

Por isso, a doutrina aponta que é provável que o instituto da prevenção seja revisto.

  • Atenção! O instituto do juiz das garantias está, por ora, suspenso pelo STF.

Citação

Sobre a citação, o art. 363 do CPP dispõe o seguinte:

Art. 363.  O processo terá completada a sua formação quando realizada a citação do acusado.

A citação é ato processual que comunica o réu sobre o início do processo.

A partir da citação, pode o réu apresentar sua defesa (resposta a acusação).

O vício na citação é compreendido, pela legislação, como gerador de nulidade absoluta (art. 564, III, e, CPP).

Fala-se, aqui, em circundução.

No processo penal, diferente do processo civil, admite-se a convalidação, em alguns casos, da nulidade absoluta.

Este é o caso do vício na citação.

Embora absoluta a nulidade, admite-se a convalidação na hipótese do réu comparecer e apresentar a resposta a acusação.

Observe o que dispõe o art. 570 do CPP:

Art. 570.  A falta ou a nulidade da citação, da intimação ou notificação estará sanada, desde que o interessado compareça, antes de o ato consumar-se, embora declare que o faz para o único fim de argüi-la. O juiz ordenará, todavia, a suspensão ou o adiamento do ato, quando reconhecer que a irregularidade poderá prejudicar direito da parte.

No processo penal, são modalidades de citação:

  1. Citação pessoal;
  2. Citação por edital;
  3. Citação por hora certa;

Lembre-se que, no juizado especial não há citação por edital (art. 18, § 2°, do CPP).

A citação pessoal é feita por oficial de justiça.

O oficial, durante a citação, lê o mandado e entrega cópia para o réu.

É, inclusive, o que dispõe o art. 357 do CPP:

Art. 357.  São requisitos da citação por mandado:

I – leitura do mandado ao citando pelo oficial e entrega da contrafé, na qual se mencionarão dia e hora da citação;

II – declaração do oficial, na certidão, da entrega da contrafé, e sua aceitação ou recusa.

É importante destacar que a citação pessoal do inimputável ocorre por meio do curador, ao passo que a citação pessoal da pessoa jurídica ocorre por meio do seu representante legal.

Em relação ao mandado de citação, esclarece o art. 352 do CPP que o mandado indicará:

I – o nome do juiz;

II – o nome do querelante nas ações iniciadas por queixa;

III – o nome do réu, ou, se for desconhecido, os seus sinais característicos;

IV – a residência do réu, se for conhecida;

V – o fim para que é feita a citação;

VI – o juízo e o lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer;

VII – a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.

Ainda em relação a citação pessoal, tem-se o seguinte:

  1. A citação do militarfar-se-á por intermédio do chefe do respectivo serviço” (art. 358 do CPP);
  2. O dia designado para funcionário público comparecer em juízo, como acusado, será notificado assim a ele como ao chefe de sua repartição (art. 359 do CPP);
  3. A citação do réu preso será feita pessoalmente, conforme art. 360 do CPP (não por meio do diretor do estabelecimento prisional);

Note que o funcionário público é citado pessoalmente, porém o chefe de sua repartição será comunicado do dia em que ele comparecer em juízo.

Em relação ao réu preso, é importante destacar que “é nula a citação por edital de réu preso na mesma unidade da federação em que o juiz exerce a sua jurisdição” (Súmula 351 do STF).

Ao lado da citação pessoal (ou real), temos a citação por edital (ou ficta).

Trata-se de um ficção jurídica que ocorre diante da impossibilidade de encontrar o réu nos endereços conhecidos pelo autor.

Diferente da citação por hora certa, aqui o réu NÃO está de má-fé.

A citação por edital ocorre por intermédio de publicação na imprensa ou saguão do fórum.

É o que dispõe o art. 365, parágrafo único, do CPP:

Art. 365 (…)

Parágrafo único.  O edital será afixado à porta do edifício onde funcionar o juízo e será publicado pela imprensa, onde houver, devendo a afixação ser certificada pelo oficial que a tiver feito e a publicação provada por exemplar do jornal ou certidão do escrivão, da qual conste a página do jornal com a data da publicação.

O edital terá prazo de 15 dias (art. 361 do CPP).

Por fim, há citação por hora certa.

Similar a citação por edital, a citação por hora certa também é ficta.

Porém, diferente da citação por edital, aqui fica constatada a má-fé do réu.

Observe o que dispõe o art. 362 do CPP:

Art. 362.  Verificando que o réu se oculta para não ser citado, o oficial de justiça certificará a ocorrência e procederá à citação com hora certa, na forma estabelecida nos arts. 227 a 229 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil.

Parágrafo único.  Completada a citação com hora certa, se o acusado não comparecer, ser-lhe-á nomeado defensor dativo.

Note que a legislação utiliza como parâmetro o Código de Processo Civil.

Quando estudamos a citação por hora certa, no processo civil, verificamos que são requisitos dessa citação:

Para ocorrer a citação por hora certa, no processo penal, será preciso respeitar os seguintes requisitos:

  1. Requisito subjetivo: suspeita de ocultação do réu;
  2. Requisito objetivo: duas tentativas de citação do réu sem êxito;

Resposta à Acusação

Trata-se da peça apresentada pela defesa que impugna a inicial acusatória.

A resposta a acusação busca não apenas a defesa do réu, como também a absolvição sumária.

O prazo para apresentar resposta a acusação é de 10 dias, contados da citação.

Sobre o prazo, o art. 798 do CPP dispõe o seguinte:

Art. 798.  Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado.

§ 1°  Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento.

§ 2°  A terminação dos prazos será certificada nos autos pelo escrivão; será, porém, considerado findo o prazo, ainda que omitida aquela formalidade, se feita a prova do dia em que começou a correr.

§ 3°  O prazo que terminar em domingo ou dia feriado considerar-se-á prorrogado até o dia útil imediato.

§ 4°  Não correrão os prazos, se houver impedimento do juiz, força maior, ou obstáculo judicial oposto pela parte contrária.

§ 5°  Salvo os casos expressos, os prazos correrão:

a) da intimação;

b) da audiência ou sessão em que for proferida a decisão, se a ela estiver presente a parte;

c) do dia em que a parte manifestar nos autos ciência inequívoca da sentença ou despacho.

Portanto, para fins de contagem, tratando-se de prazo processual, exclui-se o dia do começo e inclui-se o dia do fim do prazo.

Além disso, o prazo só começa e termina em dia útil e sua contagem inclui dia útil e dia não útil. Note que o prazo “NÃO se interrompe por férias, domingo e feriados“.

Note que, aqui, não se aplica a regra do processo civil (contagem apenas em dias úteis).

Na resposta, “o acusado poderá argüir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário” (Art. 396-A do CPP).

No âmbito do rito ordinário, pode o réu apresentar até 8 testemunhas por cada crime imputado.

Eventuais exceções devem ser apresentadas em peça apartada, pois dão ensejo a um procedimento incidental (art. 396-A, § 1°, do CPP).

Lembre-se que, no processo penal, podem ensejar a referida exceção a suspeição, a incompetência de juízo, a litispendência, a ilegitimidade de parte e a coisa julgada (art. 95 do CPP).

Sobre a absolvição sumária, esclarece o art. 397 do CPP o seguinte:

Art. 397.  Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar:

I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;

II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou

IV – extinta a punibilidade do agente.

Note que, para absolvição sumária, deve ser constatado o juízo de certeza do magistrado.

A norma fala, por exemplo, MANIFESTA causa excludente de ilicitude, ou ainda, que o fato narrado EVIDENTEMENTE não constitui crime.

Dada a necessidade de defesa técnica no Processo Penal (defesa realizada por advogado/ defensor público), DEVE a resposta à acusação ser formulada por advogado/ defensor público, sob pena de nulidade absoluta (súmula 523 do STF).

Além disso, a apresentação da resposta à acusação é OBRIGATÓRIA.

Na hipótese do réu NÃO apresentar resposta à acusação:

  1. Na citação pessoal: juiz declara a revelia, nomeia advogado dativo e devolve o prazo de 10 dias;
  2. Na citação por hora certa: juiz declara a revelia, nomeia advogado dativo e devolve o prazo de 10 dias;
  3. Na citação por edital: suspende-se o processo e a prescrição.

Na revelia do processo penal, aplica-se apenas o efeito processual (ou formal), segundo a qual o réu não será intimado para os demais atos processuais.

Note que é o réu que não será intimado e não o advogado. O advogado permanece sendo intimado, dada a obrigatoriedade da defesa técnica no processo penal.

Não se aplica o efeito material da revelia (presunção de veracidade dos fatos), dado que incide, no direito material (Direito Penal), o princípio da presunção de inocência.

Aliás, a resposta a acusação é condição de prosseguibilidade.

A citação por hora certa, por pautar-se na má-fé do réu, segue a mesma linha de raciocínio da citação pessoal.

Isso significa que, diante da citação por hora certa, o juiz declara a revelia, nomeia advogado e devolve o prazo de 10 dias.

Quanto a citação por edital, o art. 366 do CPP esclarece o seguinte:

Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.

Portanto, diante da citação por edital, o magistrado suspende o processo e o prazo prescricional.

Note que suspende o processo (natureza de direito processual) e suspende a prescrição (natureza de direito material).

Por isso, fala-se que o art. 366 do Código de Processo Penal tem natureza híbrida.

Em relação a parte penal do dispositivo (suspensão da prescrição), houve evidente novatio legis in pejus (nova lei de direito material pior para o réu), devendo-se respeitar o princípio da irretroatividade.

Segundo o art. 5°, XL, da CF, “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu“.

Por isso, o entendimento da jurisprudência foi que, em relação a suspensão da prescrição, o dispositivo só seria aplicado em relação aos crimes futuros, não retroagindo.

É importante destacar que a prescrição não pode ficar suspensa por tempo indeterminado, dado que apenas a Constituição Federal tem aptidão para tratar do tema imprescritibilidade.

A jurisprudência, nesse caso, entende que o prazo de SUSPENSÃO da prescrição segue o mesmo prazo do art. 109 do CP.

Após o decurso do prazo de suspensão da prescrição, a própria prescrição passa a correr normalmente.

Note que o juiz, diante da citação por edital, pode determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar a prisão preventiva.

A decretação da prisão preventiva NÃO é automática.

Deve-se comprovar, para tanto, a existência dos requisitos do art. 312 do CPP.

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