Competência: Conceito, Diferenças e Competência em Razão da Matéria (Processo Penal)

A jurisdição é uma das funções do Estado que tem por objetivo a solução de conflitos, de forma imparcial e em conformidade com a vontade geral consignada em normas gerais e abstratas aplicáveis ao caso concreto.

Já estudamos a jurisdição, de forma bastante aprofundada, lá no Processo Civil Desenhado.

A ideia, aqui, é bastante similiar…

No processo penal, a jurisdição é o poder-dever de realização de justiça estatal pelos órgãos do Estado.

É uma jurisdição cognitiva, destinada a conhecer da pretensão acusatória e exercer o poder punitivo que detém o Estado.

A competência, por sua vez, é o que limita o poder e cria condições de eficácia para garantia da jurisdição.

A competência, então, surge para organizar o exercício da jurisdição.

É importante destacar que o entendimento majoritário sustenta que, no processo penal, não existe lide (conflito de interesses), mas sim demanda penal.

Isso porque, em ultima análise, o réu e o titular da ação buscam a aplicação do direito de forma justa.

Não há como admitir, por exemplo, que o o objetivo do Ministério Público é ver o réu atras das grades…

Até porque o Ministério Público, detentor da opinião delitiva, pode entender que o réu, em verdade, é inocente, e, neste cenário, postular pela absolvição.

Aliás, o Ministério Público poderia, inclusive, recorrer em favor do réu, ante, por exemplo, a discordância do magistrado.

Competência Relativa X Competência Absoluta

A competência, como já observamos, é a delimitação da jurisdição.

Ela pode ser classificada em absoluta ou relativa.

A competência absoluta é assim chamada porque ela não é passível de sofrer prorrogação, por se tratar de interesse público.

Além disso, a competência absoluta tem previsão constitucional.

Diante desse cenário, é possível o reconhecimento de ofício a qualquer tempo.

No processo penal, ela é estabelecida em razão da matéria, da pessoa ou da função e não pode ser alterada, nem mesmo por conexão ou continência.

Diante da incompetência absoluta, anula-se atos decisórios e aproveita-se as provas produzidas (atos instrutórios).

Observe o que dispõe o art. 567 do CPP:

Art. 567.  A incompetência do juízo anula somente os atos decisórios, devendo o processo, quando for declarada a nulidade, ser remetido ao juiz competente.

Na competência relativa prepondera o interesse das partes.

A previsão da competência relativa é infraconstitucional.

A ideia, aqui, é que sua violação deve ser alegada no momento oportuno, sob pena de prorrogação de competência.

Ela é passível de prorrogação, por se tratar de interesse preponderantemente privado.

A violação da competência relativa, portanto, deve ser alegada no momento oportuno, sob pena de prorrogação de competência.

Diante da não alegação no momento oportuno, ocorre a preclusão.

Parte da doutrina, inclusive, fala em aplicação da Súmula 33 do STJ que dispõe o seguinte:

Súmula 33 do STJ: A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.

O grande problema é que tal súmula foi concebida para o Processo Civil (e não para o processo penal), daí porque parte da doutrina sustenta que a súmula 33 do STJ é inaplicável ao processo penal.

Parte da doutrina entende que não há competência relativa na esfera penal, prestigiando, com isso, o princípio do juiz natural.

No processo penal, a única competência relativa é a territorial.

Critérios de Definição da Competência

Competência Material

Há 3 espécies de competência material:

  1. Competência em razão da matéria (ou “ratione materiae“);
  2. Competência em razão do lugar (ou “ratione loci”);
  3. Competência em razão da pessoa (ou “ratione personae“).

Nos próximos tópicos, vamos estudar cada um deles.

Competência em razão da matéria (“ratione materiae“)

Responde-se, por meio desse critério, qual é a justiça competente para julgar uma determinada infração penal.

Afere-se, por meio desse critério, se o crime é julgado pela justiça comum ou justiça especializada.

Justiça Comum

A justiça comum subdivide-se em:

  1. Justiça Comum Estadual;
  2. Justiça Comum Federal.

A competência da justiça comum estadual é residual.

Isso significa que a definição, na prática, ocorre por exclusão.

O crime que a Constituição Federal não conferiu, a título de competência, as demais justiças, será de competência da justiça comum estadual.

Em contraposição, a justiça comum federal é definida, expressamente, pela Constituição Federal (art. 108 e art. 109, IV a X, todos da CF/88).

Justiça Especial

Em paralelo a justiça comum, há a justiça especial.

A Justiça Especial é um tipo de jurisdição que, por causa das suas especificidades, é disciplinada por leis processuais próprias e julgadas por um ramo do Judiciário específico para tais questões.

Neste cenário, a Justiça Especial é constituída pela:

  1. Justiça do Trabalho;
  2. Justiça Eleitoral;
  3. Justiça Militar (da União e dos Estados).

A justiça do trabalho não será estudada no âmbito do processo penal, pois NÃO tem competência para julgar crimes, mesmo aqueles relacionados ao trabalho (e.g crimes contra a organização do trabalho).

Em relação a justiça eleitoral, há infrações eleitorais no Código Eleitoral e na legislação eleitoral especial.

A justiça eleitoral tem competência para julgar:

  1. Infrações eleitorais;
  2. Infrações penais comuns (estadual ou federal), mas com conexão/ continência com infração eleitoral;

É importante consignar que o Supremo Tribunal Federal, em março de 2019, decidiu por maioria de votos, que compete à Justiça Eleitoral processar e julgar os crimes comuns (estaduais ou federais) conexos com os crimes eleitorais.

Aliás, a justiça eleitoral julgará, inclusive, crimes cuja pena máxima não supera 2 anos que seriam, como regra geral, julgados pelo Juizado Especial, seguindo, contudo, o rito do Código Eleitoral.

Contudo, aqui é preciso ter atenção, pois os institutos despenalizadores da lei de juizado especial devem ser aplicados pela justiça eleitoral no julgamento de crimes dessa espécie.

Pode-se, por exemplo, aplicar, na justiça eleitoral, o instituto da transação penal e da suspensão condicional do processo.

Em paralelo a justiça eleitoral, tem-se a justiça militar.

A justiça militar julgará as infrações delimitadas pelo art. 9° e 10 do Código Penal Militar.

Aqui, diferente da justiça eleitoral, não se aplicam institutos despenalizadores da lei 9.099.

Aliás, não se aplica nenhum dispositivo com previsão da lei 9.099 na justiça militar.

É o que dispõe o art. 90-A d alei 9.099:

Art. 90-A.  As disposições desta Lei não se aplicam no âmbito da Justiça Militar.

No âmbito da justiça militar, temos o seguinte:

  1. Justiça militar estadual;
  2. Justiça militar federal.

A justiça militar estadual julga infrações militares praticados pelo:

  1. Policial militar;
  2. Bombeiro militar.

A justiça militar estadual não julgada, em nenhuma hipótese, pessoas comuns.

Em paralelo, a justiça militar federal julgará;

  1. Membros das forças armadas (exército, marinha e aeronáutica);
  2. Pessoas comuns que pratiquem crime militar federal.

Competência pela Natureza da Infração

Dentro da competência em razão da matéria, há o subtema competência pela natureza da infração.

O legislador, aqui, pode estabelecer o órgão competente para julgar um tipo específico de crime em razão da sua natureza.

Há, neste particular, duas hipóteses constitucionais importantes:

  1. Crimes dolosos contra a vida são julgados pelo Tribunal do Júri (Art. 5°, XXXVIII, d, da CF/88);
  2. Infrações de menor potencial ofensivo são julgados pelo Juizado Especial (art. 98, I, CF/88).

Lembro, por oportuno, que “consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa” (art. 61 da lei 9.099).

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