Competência em Razão do Lugar (“ratione loci”) – Processo Penal

Por meio da competência em razão do lugar define-se o juízo territorialmente competente.

É preciso, nesse primeiro momento, definir o seguinte: “o local do crime é o local da ação/ conduta ou o local do resultado?“.

Para responder essa questão surgiram 3 teorias importantes:

  1. Teoria do Resultado;
  2. Teoria da Atividade;
  3. Teoria da Ubiquidade.

A teoria do resultado aponta que a competência é fixada pelo lugar da consumação da infração, pouco importando o local da ação/ conduta.

No Processo Penal, a competência em razão do lugar é, como regra, a competência delimitada de acordo com o lugar onde foi consumado o crime, conforme o artigo 70, caput do Código de Processo Penal.

Art. 70.  A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.

O local da consumação do crime, portanto, é o parâmetro para fixar a competência.

Isso significa que a regra geral de competência no processo penal segue a Teoria do Resultado.

Contudo, existem exceções a essa regra, conforme vou explicar nas demais teorias.

A teoria da atividade (ou teoria da ação) destaca que a competência territorial será o lugar do último ato de execução do crime, pouco importando o local da consumação.

Aplica-se essa teoria, excepcionalmente, no âmbito do crime tentado, até porque o crime tentado não se consuma por circunstâncias alheias a vontade do agente.

Também, excepcionalmente, aplica-se a teoria da ação na competência territorial do Tribunal do Júri.

Trata-se de posição majoritária no STJ, já que, no local da ação, é mais fácil obter provas (e.g. testemunhas).

Também aplica-se a teoria da ação nos crimes de menor potencial ofensivo a serem julgados pelo Juizado Especial.

É o que dispõe o art. 63 da lei 9.099:

Art. 63. A competência do Juizado será determinada pelo lugar em que foi praticada a infração penal.

Por fim, a teoria da ubiquidade esclarece que a competência será o local da ação/ omissão e o local da consumação.

A teoria da ubiquidade é aplicada, apenas, nos crimes de espaço máximo.

Crimes de espaço máximo, também conhecidos como crimes à distância, são aqueles em que a conduta e o resultado ocorrem em países distintos, gerando um conflito de competência internacional.

Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 70, § 1° e § 2°, do CPP:

Art. 70 (…)

§ 1°  Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último ato de execução.

§ 2°  Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado.

Imagine, por exemplo, que uma pessoa envia uma carta bomba de São Paulo (local da ação) à outra pessoa em Paris, onde vem a explodir (local da consumação).

Quando não se sabe o lugar da infração?

Nesse caso, será competente o juízo competente relacionado ao domicílio/ residência do réu.

Trata-se de regra subsidiária, aplicando-se apenas diante de impossibilidade de utilizar as teorias territoriais.

Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 72 do CPP:

Art. 72.  Não sendo conhecido o lugar da infração, a competência regular-se-á pelo domicílio ou residência do réu.

§ 1°  Se o réu tiver mais de uma residência, a competência firmar-se-á pela prevenção.

§ 2°  Se o réu não tiver residência certa ou for ignorado o seu paradeiro, será competente o juiz que primeiro tomar conhecimento do fato.

Note, ainda, que:

  1. Se o réu tem mais de uma residência, a competência será fixada pela prevenção;
  2. Se o réu NÃO tem residência certa ou for ignorado o seu paradeiro, a competência será do primeiro juiz que tomar conhecimento do fato.

Juiz prevento é aquele que teve o primeiro contato com a causa.

Esse primeiro ato, no âmbito do processo penal, poderá ser:

  1. O recebimento da inicial acusatória;
  2. A adoção de medida cautelar na fase do Inquérito Policial.

É importante destacar que, segundo o art. 3°-B do CPP, cabe ao juiz das garantias adotar medidas cautelares no Inquérito Policial.

Na redação original, caberia ao juiz das garantias também decidir se receberia ou não a inicial acusatória.

Contudo, a função de receber ou não a inicial acusatória, a partir do julgamento do STF sobre o assunto, passou a ser do juiz da instrução.

Em paralelo, também, o juiz das garantias fica IMPEDIDO de funcionar no processo (Art. 3°-D do CPP).

Por isso, diante do art. 3°-B do CPP, não haveria mais a prevenção.

Note, ate aqui, que, como regra, o domicílio da vítima não tem aptidão para fixar competência territorial.

Contudo, em razão da lei 14.155/2021, admite-se, excepcionalmente, a fixação de competência territorial pelo domicílio da vítima no crime de estelionato, mas APENAS no caso o crime seja praticado:

  1. Mediante depósito;
  2. Mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com pagamento frustrado;
  3. Mediante transferência de valores.

É o que dispõe o art. 70, § 4º , do CPP:

Art. 70. (…)

§ 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção.

É interessante notar que, de acordo com a Súmula 48 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a competência territorial para julgar casos de estelionato cometidos mediante cheque falsificado é definida pelo local onde a vantagem indevida foi obtida.

Trata-se de hipótese que permanece íntegra, já que o cheque falsificado não faz parte das hipóteses elencadas pelo art. 70, § 4º, do CPP.

Competência na Ação Penal Privada

Na ação penal de iniciativa privada a vítima/ ofendido pode optar (faculdade) por ajuizar a ação no domicílio/ residência do réu.

É o que define o art. 73 do CPP:

Art. 73.  Nos casos de exclusiva ação privada, o querelante poderá preferir o foro de domicílio ou da residência do réu, ainda quando conhecido o lugar da infração.

Note, portanto, que as regras territoriais aplicam-se ao caso concreto, porém, o legislador resguarda, à vítima, a faculdade de optar pelo local do domicilio do réu.

Muita atenção, pois não se trata do domicílio da vítima.

NÃO se aplica essa regra, contudo, na ação penal privada SUBSIDIÁRIA da pública.

Competência Territorial Brasileira nos crimes cometidos em Embarcações e Aeronaves

Quando estudamos a lei penal do espaço, explicamos o conceito de território brasileiro.

Conhecer esse tema para o processo penal acaba sendo imprescindível para tratarmos do tema competência.

O território nacional é formado por:

  1. Fronteiras;
  2. Espaço aéreo;
  3. Mar territorial (0 a 12 milhas náuticas, contadas na maré baixa).

Há, contudo, o território nacional por equiparação.

Nesse particular, o art. 5°, § 1º, do CP, dispõe o seguinte:

Art. 5º (…)

§ 1º – Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiroonde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

§ 2º – É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil.

Será, portanto, território nacional por equiparação:

  1. Embarcações/ Aeronaves de natureza pública e bandeira brasileira, onde quer que se encontrem;
  2. Embarcações/ Aeronaves de natureza privada e bandeira brasileira, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.
  3. Embarcações/ Aeronaves de natureza privada e bandeira estrangeira, que se achem no território brasileiro.

Note que Embarcações/ Aeronaves de natureza pública e bandeira estrangeira nunca será considerado território brasileiro.

Na hipótese da embarcação/ aeronave estar no conceito de território brasileiro (ainda que por equiparação), aplicam-se as seguintes regras.

Art. 89.  Os crimes cometidos em qualquer embarcação nas águas territoriais da República, ou nos rios e lagos fronteiriços, bem como a bordo de embarcações nacionais, em alto-mar, serão processados e julgados pela justiça do primeiro porto brasileiro em que tocar a embarcação, após o crime, ou, quando se afastar do País, pela do último em que houver tocado.

Art. 90.  Os crimes praticados a bordo de aeronave nacional, dentro do espaço aéreo correspondente ao território brasileiro, ou ao alto-mar, ou a bordo de aeronave estrangeira, dentro do espaço aéreo correspondente ao território nacional, serão processados e julgados pela justiça da comarca em cujo território se verificar o pouso após o crime, ou pela da comarca de onde houver partido a aeronave.

Na prática, portanto, temos a seguinte regra para a hipótese da embarcação/ aeronave estar no conceito de território brasileiro (ainda que por equiparação):

  1. Na hipótese de viagens nacionais, a competência territorial será do juízo do primeiro local do pouso/ atracagem após o delito;
  2. Na hipótese de viagens internacionais, a competência territorial será  do juízo do local de saída/ embarque OU de chegada.

Competência Territorial Brasileira nos crimes cometidos no estrangeiro

Sobre o tema, o art. 88 do CPP esclarece o seguinte:

Art. 88.  No processo por crimes praticados fora do território brasileiro, será competente o juízo da Capital do Estado onde houver por último residido o acusado. Se este nunca tiver residido no Brasil, será competente o juízo da Capital da República.

Portanto, na hipótese do crime ter sido praticado fora do território brasileiro, o agente será julgado, como regra, na capital do estado brasileiro onde por último residiu.

Na hipótese, contudo, de NUNCA ter morado no Brasil, será julgado em Brasília.

Direito de Passagem Inocente

O direito de passagem inocente é um conceito do direito internacional que se refere ao direito de um navio de qualquer nacionalidade de passar pelo mar territorial de outro país de forma contínua e rápida, sem prejudicar a paz, a boa ordem ou a segurança do Estado costeiro.

Note que, em regra, embarcações de natureza privada e bandeira estrangeira, que se achem no território brasileiro, são considerados território brasileiro.

Por isso, a lógica é que, diante de um crime ocorrido no âmbito dessa embarcação, aplica-se a lei brasileira e será julgado pelo brasil.

Contudo, isso poderia afetar a navegação e o comércio internacional marítimo.

Para evitar isso, há tratados internacionais que asseguram o direito de passagem inocente.

No Brasil, esse direito é regulado pelo art. 3° da Lei nº 8.617/1933.

O Brasil, diante do direito de passagem inocente, não apura infrações em embarcações de passagem pela costa brasileira.

Isso contudo ocorre, apenas, se NÃO existir grave repercussão da infração penal cometida no nosso território.

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