Desdobramento do Inquérito Policial

Feito o relatório que encerra o inquérito policial, deve-se remeter os autos ao juiz das garantias.

Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 23 do CPP:

Art. 23.  Ao fazer a remessa dos autos do inquérito ao juiz competente, a autoridade policial oficiará ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o juízo a que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do indiciado.

Atenção! O instituto do juiz de garantias está, por ora, suspenso por decisão do STF (ADI 6.298)

É curioso observar que, em alguns Estados, a remessa será feita diretamente ao Ministério Público por intermédio da central de inquérito.

Contudo, nesse particular, é preciso destacar que o STF já declarou a inconstitucionalidade de lei estadual que regulou a tramitação direta de inquérito policial entre delegado e Ministério Público.

No âmbito federal, o inquérito é remetido a vara federal para cadastramento sistêmico, seguindo à procuradoria da república, independentemente de despacho do juiz.

É o que determina a resolução 63 do CJF.

Tal resolução, contudo, também vem sendo objeto de intenso debate.

Na prática, a ideia é que, em verdade, o inquérito precisa ser enviado primeiro ao Juiz para que o magistrado, diante disso, abra vistas ao Ministério Público.

Após abrir vista ao Ministério Público, poderá ele, no crime de ação penal privada, opinar pela manutenção do inquérito na vara criminal.

Neste caso, cabe ao advogado da vítima acessar os autos e aferir se propõe ou não a ação.

Vale destacar que o advogado pode obter cópias do inquérito na própria delegacia.

Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 19 do CPP:

Art. 19.  Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado.

No âmbito do crime de ação penal pública, contudo, após abrir vistas ao Ministério Público, pode o membro do MP:

  1. Oferecer a denúncia (art. 24 do CPP);
  2. Oferecer acordo de não persecução penal (art. 28-A do CPP) nos crimes:
    • Com pena mínima inferior a 4 anos;
    • Sem violência ou grave ameaça;
    • Não faz parte da lei maria da penha (lei 11.340/06).
  3. Requisitar novas diligências entendidas como imprescindíveis;
  4. Promover o arquivamento do inquérito;

É importante destacar que a requisição de novas diligências pelo Promotor de Justiça ao Delegado de Polícia é incompatível com a manutenção/ decretação da prisão preventiva.

Isso porque tal conduta deixa claro que, até aquele momento, inexiste justa causa para a oferta da denúncia e, como consequência, da manutenção/ decretação da prisão preventiva.

Quanto ao arquivamento do inquérito policial, ocorreram algumas alterações importantes…

Sustentava o CPP, em um primeiro momento, que, caso o magistrado discordasse do arquivamento, deveria determinar a remessa dos autos ao procurador geral.

O problema é que, para a doutrina, tal comportamento fere imparcialidade do juiz, requisito indispensável para o exercício da jurisdição.

Em verdade, sequer existe a jurisdição sem imparcialidade.

Na prática e considerando o conceito de jurisdição, não faz sentido admitir a participação do juiz do procedimento de arquivamento do inquérito policial.

Viola, sem dúvida alguma, o sistema acusatório, adentrado no sistema inquisitório.

Vale lembrar que no sistema inquisitório, diferente do sistema acusatório, não há essa separação de funções.

O juiz assume o papel de acusador e gestor da prova, tendo muitas prerrogativas e poderes (concentração de poderes).

O processo penal, contudo, trabalha com o sistema acusatório, com nítida separação das funções de acusar, julgar e defender no processo penal.

No sistema acusatório, há uma clara distinção entre essas funções, que são exercidas por pessoas ou instituições diferentes.

Por isso, o pacote anticrime (lei 13.964/19) alterou essa sistemática…

Observe a antiga redação original do art. 28 do CPP:

Art. 28. Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial e encaminhará os autos para a instância de revisão ministerial para fins de homologação, na forma da lei.

Note que, na redação original, não há, no procedimento de arquivamento do inquérito policial, qualquer participação do juiz.

Ocorre que esse dispositivo foi suspenso em um primeiro momento pelo STF em razão da ADI 6.300 e ADI 6.305.

Ao julgar as ações em 2023, o STF entendeu que o termo “ordenado” é inconstitucional e substituiu por “manifestando-se pelo”.

Por isso, hoje prevalece um cenário similar ao anterior ao pacote anticrime (lei 13.964/19).

Na prática, não houve grande alteração e a decisão do STF implicou em grave prejuízo ao sistema acusatório.

O juiz, com a decisão do STF, permanece realizando o controle do arquivamento do inquérito policial em detrimento do sistema acusatório.

Poderá o juiz realizar o controle no caso de flagrante ilegalidade ou decisão teratológica.

Contudo, na hipótese do juiz CONCORDAR com o arquivamento, permaneceu, no STF, a tese de que a vítima poderá manifestar-se contra o arquivamento do inquérito (novidade do pacote anticrime prevista no art. 28, § 1º, do CPP).

Portanto, manifestando-se pelo arquivamento, o Ministério Público deve comunicar a vítima (art. 28, caput, do CPP). 

Na hipótese do juiz concordar com o arquivamento, a vítima poderá discordar… 

Nesse cenário, “se a vítima, ou seu representante legal, não concordar com o arquivamento do inquérito policial, poderá, no prazo de 30 (trinta) dias do recebimento da comunicação, submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial, conforme dispuser a respectiva lei orgânica.” (art. 28, § 1º, do CPP).

Portanto, os autos serão remetidos à instância de revisão ministerial se:

  1. O juiz discordar do arquivamento (posição do STF);
  2. A vítima discordar do arquivamento (art. 28, § 1º, do CPP).

Neste caso, a instância de revisão ministerial poderá:

  1. Oferecer a denúncia;
  2. Designar outro Promotor para oferecer a denúncia;
  3. Insistir no arquivamento;

Note que o promotor designado DEVE oferecer a denúncia, pois atua, neste particular, por delegação do Procurador Geral.

No julgamento da constitucionalidade do art. 28 do CPP, também permaneceu íntegra a redação do art. 28, § 2º, do CPP que dispõe o seguinte:

Art. 28 (…)

§ 2º Nas ações penais relativas a crimes praticados em detrimento da União, Estados e Municípios, a revisão do arquivamento do inquérito policial poderá ser provocada pela chefia do órgão a quem couber a sua representação judicial. 

Note que o promotor designado DEVE oferecer a denúncia, pois atua, neste particular, por delegação do Procurador Geral.

Vale destacar que o arquivamento do Inquérito Policial NÃO faz coisa julgada material.

Poderá o promotor, por exemplo, diante do surgimento de novas provas, apresentar denúncia.

Isso significa que o arquivamento do inquérito policial, em última análise, não tem aptidão para inocentar o investigado.

Para o STF, contudo, será preciso novas provas (posterior ao arquivamento) para o oferecimento da denúncia.

Por isso, em paralelo, tem-se defendido que o arquivamento do inquérito policial FAZ coisa julgada formal (e não material).

É o que determina a súmula 524 do STF:

Súmula 524 do STF: Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.

Tem-se compreendido que as novas provas, neste caso, são condição de procedibilidade (natureza jurídica).

É importante observar que o delegado de polícia, diante na notícia de provas novas, pode realizar diligências.

É o dispõe o art. 18 do CPP:

Art. 18.  Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia.

Ao alcançar provas novas, deve o delegado remeter o inquérito ao Ministério Público que, ao analisar, vai decidir se opta pelo desarquivamento (ou não) do inquérito policial.

Além disso, essas provas novas são classificadas, pela doutrina, em:

  1. Prova substancialmente nova: é a prova inédita;
  2. Prova formalmente nova: é a prova já conhecida, mas que é alterada (e.g. novo depoimento);

Repise-se que o arquivamento, como regra, FAZ coisa julgada formal (e não material).

Há contudo, duas exceções que precisam ser conhecidas…

São hipóteses em que o arquivamento do inquérito se torna definitivo.

Isso ocorre na hipótese do arquivamento decorrer de certeza de:

  1. atipicidade (formal e material)];
  2. extinção da punibilidade.

Não entra, aqui, a excludente de ilicitude ou culpabilidade.

Dentro do âmbito do arquivamento, ainda, é importante destacar o que é o denominado arquivamento originário.

Arquivamento originário é o arquivamento promovido pelo procurador geral do MP nas hipóteses de sua atribuição originária.

Nesse caso, não há possibilidade de insurgência por parte do Tribunal.

Cabe ao Tribunal apenas a homologação.

Há, ainda, quem defenda o arquivamento implícito.

Tal arquivamento ocorre quando o membro do Ministério Público, ao oferecer a denúncia, deixa de alocar, na denúncia, determinado sujeito contemplado no inquérito policial (arquivamento implícito subjetivo) ou determinado crime contemplado no inquérito policial (arquivamento implícito objetivo).

Para essa doutrina, deveria o juiz, ao receber denúncia incompleta, remeter os autos ao Procurador Geral.

Na hipótese do magistrado, todavia, receber denúncia incompleta, eventual aditamento da denúncia por parte do promotor dependeria de novas provar.

Esse entendimento, contudo, não é admitido pela jurisprudência por falta de previsão legal.

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