Neste artigo, você vai aprender, de forma didática, o que vem a ser o bem de família.
Segundo o art. 1° da lei 8.009/90 “o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.“
Há um enorme debate na doutrina e jurisprudência em relação ao tema.
Bem de família guarda forte relação com a teoria do patrimônio mínimo, bem como com o neoconstitucionalismo.
Parece complicado, mas é bastante fácil de entender…
O neoconstitucionalismo impôs nova diretriz ao tratamento jurídico direcionado as relações privadas.
Neoconstitucionalismo nada mais é do que um movimento teórico de revalorização do Direito Constitucional.
Você pode estar se perguntando: “mas o que isso tem haver com patrimônio mínimo e bem de família?“
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Na verdade, tudo.
No neoconstitucionalismo, a releitura do direito constitucional ocorre por meio da valorização dos direitos humanos, cuja expressão máxima são os direitos fundamentais.
É um movimento que se desenvolve na segunda metade do Sec. XX e que visa à modificar (alterar) os modos de compreender, interpretar e aplicara as Constituições, bem como o Direito Constitucional subjacente (adstrito as mesmas).
A doutrina aponta três marcos do neoconstitucionalismo:
- Marco histórico;
- Marco filosófico;
- Marco teórico.
O marco histórico do neoconstitucionalismo é o Estado Constitucional de Direito que surge nas ultimas décadas do século XX.
O marco filosófico, por sua vez, é o pós-positivismo.
Trata-se do movimento que visa superar a dicotomia jusnaturalismo-positivismo.
Busca, portanto, ir além da legalidade estrita, mas não desconsidera o direito posto.
Com isso temos uma reaproximação do Direito com a Ética, Justiça e Moral.
Por fim, o marco teórico do neoconstitucionalismo é um conjunto de mudanças que incluem a força normativa da Constituição, a expansão da jurisdição constitucional.
Surge, no marco teórico, um conjunto de novas técnicas de interpretação da Constituição (nova hermenêutica constitucional).
São características do neoconstitucionalismo:
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Bem de Família (Direito Civil) – Resumo Completo
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- Constitucionalização do direito;
- Reconhecimento da força normativa da constituição;
- Reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos;
- Efetivação e concretização dos Direitos Fundamentais, tendo como núcleo axiológico a dignidade humana;
- Inserção da filosofia do direito nos debates constitucionais;
- Reaproximação entre Direito, Ética, Justiça e Moral;
- Judicialização das políticas das relações sociais;
- Releitura da concepção de normas jurídicas por meio da:
- Nova teoria da norma jurídica, com o reconhecimento da força normativa dos princípios;
- Nova teoria das fontes com o fortalecimento do papel do Poder Judiciário na concretização da Constituição;
- Nova teoria da interpretação com novos métodos de interpretação.
Para nosso estudo, uma característica muito importante é a constitucionalização do direito.
A constitucionalização do direito nada mais é, do que ampliar o sentido e alcance da Constituição de forma a atingir, sem necessidade de ponte infraconstitucional, outros ramos do direito.
A Constituição, então, está em todos os lugares e não pode ser ignorada. Fala-se, inclusive, em ubiquidade constitucional.
Dai vem a ideia, por exemplo, de Direito Civil Constitucional.
A teoria do patrimônio mínimo reforça essa leitura constitucional do Direito Civil.
Segundo esta teoria, para garantir a dignidade da pessoa humana, não basta proteger os direitos da personalidade.
Será preciso resguardar, também, um mínimo patrimonial.
O mesmo ocorre quanto ao bem de família (lei 8.009/90).
Como já observamos, segundo o art. 1° da lei 8.009/90, a proteção recai sobre o imóvel residencial do casal ou entidade familiar.
Inclui-se na impenhorabilidade, também:
- Construções, plantações e benfeitorias do imóvel;
- Todos os equipamentos, inclusive profissional, que guarnecem a casa, desde que quitados.
Em razão da leitura constitucional do Direito Civil, optou a jurisprudência por ampliar o conceito de família.
Resguarda-se, com isso, a concepção existencialista da Constituição.
Família pode ser compreendida como aquela formada por homem e mulher no casamento, como também poderá ser família a:
- União estável;
- Família monoparental;
- Família homoafetiva;
- Família multiparental.
Curioso observar que, também em razão da leitura constitucional do Direito Civil, o conceito de entidade familiar protege, inclusive, a pessoa que é separada e vive sozinha (Súmula 364 do STJ).
A preservação da entidade familiar se mantém, ainda que o cônjuge separado judicialmente venha a residir sozinho (REsp 859.937).
E mais…
Na atualidade, a proteção não é dirigida a entidade familiar, mas sim ao ser humano.
Essa interpretação ganhou força com a EC 26/2000 que incluiu o direito à moradia no rol de direitos sociais (art. 6º da CF/88).
Explicamos esse tema, passo a passo, no vídeo abaixo.
Mas a leitura constitucional do Direito Civil vai mais além…
Segundo a jurisprudência, o imóvel alugado a terceiro para que sua proprietária possa prover os meios de subsistência constitui bem de família. (STJ – AgRg no AgRg no REsp: 1127611 SP 2009/0044556-6, Relator: Ministro ARI PARGENDLER, Data de Julgamento: 17/09/2013, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/09/2013)
Significa dizer que a proteção do bem de família pode atingir , inclusive, o bem alugado a terceiro.
A questão mais recente e que ainda enfrenta debate na jurisprudência guarda relação com a possibilidade de penhorar imóvel de luxo, ainda que seja bem de família.
A ideia por trás da tese é vender o bem e resguardar quantia mínima para aquisição de novo bem imóvel, protegendo, com isso, a dignidade da entidade familiar.
Essa tese, contudo, não tem sido admitida pelo Superior Tribunal de Justiça.
O Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que”a Lei nº 8.009/90 não estabelece qualquer restrição à garantia do imóvel como bem de família no que toca a seu valor nem prevê regimes jurídicos diversos em relação à impenhorabilidade, descabendo ao intérprete fazer distinção onde a lei não o fez (STJ – REsp: 1719415 RO 2018/0012418-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Publicação: DJ 16/04/2018)
Para o Superior Tribunal de Justiça, apenas na hipótese de existir mais de um imóvel utilizado como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, garantido ao devedor a proteção do patrimônio mínimo.
Cito, abaixo, parcela de outra decisão que também esclarece a posição atual do Tribunal.
“Na hipótese, não se afigura viável que, para a satisfação do crédito, o exequente promova a penhora, total, parcial ou de percentual sobre o preço do único imóvel residencial no qual comprovadamente reside a executada e sua família, pois além da lei 8009/90 não ter previsto ressalva ou regime jurídico distinto em razão do valor econômico do bem, questões afetas ao que é considerado luxo, grandiosidade, alto valor estão no campo nebuloso da subjetividade e da ausência de parâmetro legal ou margem de valoração. 7. Recurso especial desprovido.”(STJ – REsp: 1351571 SP 2012/0226735-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 27/09/2016, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/11/2016)
A proteção do bem de família também incide sobre imóveis em construção, ou ainda, em casos em que a parte tem apenas a posse.
Há duas espécies de bem de família.
- Bem de família voluntário;
- Bem de família involuntário
No bem de família involuntário a proteção incide de forma automática.
Em outras palavras, a proteção não depende de qualquer ato ou manifestação de vontade por parte da entidade familiar.
Também não depende de escritura pública ou registro, bastando comprovar que o imóvel é utilizado para fins de moradia.
Conforme já estudamos, também pode ser comprovado que o imóvel, locado a terceiro, provê a subsistência da entidade familiar.
Por fim, é importante destacar que a própria lei 8.009/90 aponta hipóteses em que a impenhorabilidade não se aplica.
Não será impenhorável:
- Veículos de transporte;
- Obras de arte;
- Adornos suntuosos;
A impenhorabilidade não é oponível quando:
- Cobrança de crédito decorrente de financiamento para construção/ aquisição do imóvel;
- Cobrança de pensão alimentícia, resguardado o direito do coproprietário;
- Cobrança de IPTU, ITR, taxas e contribuições devidas em função do imóvel;
- Execução de Hipoteca sobre o próprio imóvel oferecida pelo casal como garantia;
- Imóvel adquirido com produto de crime;
- Obrigação decorrente de fiança.