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ToggleEm primeiro lugar, é muito importante compreender a Teoria Geral dos Recursos.
O objetivo do recurso é impugnar decisões judiciais…
O recurso tem como fundamento o inconformismo da parte e o reconhecimento, pelo Estado, da possibilidade de erro nas decisões.
O recurso pode ser compreendido como um instrumento de impugnação voluntário que, dentro da relação processual, visa a reforma, invalidação, esclarecimento ou integração da decisão.
Note que o recurso é voluntário (depende da manifestação de vontade da parte), sendo apresentado dentro da mesma relação processual.
Por ser apresentado dentro da mesma relação processual, falamos em meio de impugnação endoprocessual (dentro do processo).
Lembro, por oportuno, que o meio de impugnação endoprocessual se contrapõe ao meio de impugnação extraprocessual (fora do processo – e.g. Habeas Corpus).
Apenas a título de complemento, é interessante observar que a doutrina chama o meio de impugnação extraprocessual de ação autônoma de impugnação.
O recurso pode ser compreendido, ainda, como um desdobramento do direito de ação.
Trata-se da natureza jurídica do recurso (desdobramento do direito de ação).
Princípios dos Recursos
São princípios dos recursos:
- Princípio da Voluntariedade;
- Princípio da Colegialidade;
- Princípio da Fungibilidade;
- Princípio da Conversão;
- Princípio da unirrecorribilidade;
- Princípio da taxatividade;
- Princípio da “non reformatio in pejus“;
- Princípio da “reformatio in melius”;
- Princípio da complementaridade;
Vou falar sobre cada um dos princípios nos próximos tópicos.
Princípio da Voluntariedade
Segundo o princípio da voluntariedade, a parte recorre apenas se entender adequado.
Não há, em outras palavras, obrigação/ imposição para o recurso.
É curioso observar que, na prática, existem algumas decisões que devem ser apreciadas pelo tribunal, independentemente de recurso interposto pela parte.
Por isso, parte da doutrina chama esse fenômeno de “recurso de ofício” (ou remessa necessária/ obrigatória).
Entretanto, na prática, não se trata de recurso, dado que inexistente a voluntariedade.
Para parte da doutrina, no âmbito processual penal, o “recurso de ofício” não foi recepcionado, dado que viola o sistema acusatório.
Isso porque, no sistema acusatório, cabe ao acusador (Ministério Público) recorrer se entender ser a conduta adequada no processo…
Para a jurisprudência, contudo, o “recurso de ofício” seria, em verdade, condição de eficácia da decisão.
Sem o recurso de ofício, a decisão sequer transita em julgado (Súmula 423 do STF).
Súmula 423 do STF: Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege.
No Código de Processo Penal, as hipóteses de recurso de ofício estão no art. 574 e 746 do CPP:
Art. 574. Os recursos serão voluntários, excetuando-se os seguintes casos, em que deverão ser interpostos, de ofício, pelo juiz:
I – da sentença que conceder habeas corpus;
II – da que absolver desde logo o réu com fundamento na existência de circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena, nos termos do art. 411. (tacitamente revogado – Posição do STJ)
(…)
Art. 746. Da decisão que conceder a reabilitação haverá recurso de ofício.
Para o STJ, o inciso II do art. 574 foi tacitamente revogado.
Tratava-se da hipótese de recurso de ofício diante da absolvição sumária na primeira fase do Júri.
Isso porque, no art. 416 do CPP, esclareceu o legislador que cabe apelação da decisão que absolve sumariamente o réu.
Art. 416. Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá apelação.
Portanto, cabendo, por opção legislativa, recurso voluntário, resta revogado, tacitamente, o recurso de ofício do art. 574, II, do CPP.
Há, também, recurso de ofício na lei do mandado de segurança (art. 14, § 1, da lei 12.016)
Art. 14. (…)
§ 1 Concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição.
Também há hipótese de recurso de ofício no art. 7 da lei 1.521/51:
Art. 7º. Os juízes recorrerão de ofício sempre que absolverem os acusados em processo por crime contra a economia popular ou contra a saúde pública, ou quando determinarem o arquivamento dos autos do respectivo inquérito policial.
Portanto, são hipóteses de “recurso de ofício”:
- Concessão de Habeas Corpus pelo juiz de 1 grau (art. 574, I, do CPP);
- Concessão da reabilitação criminal pelo juiz de 1 grau (art. 746 do CPP);
- Arquivamento no Inquérito/ Absolvição nos Crimes Contra Economia Popular ou Contra a saúde pública (art. 7, da lei 1.521/51)
- Concessão do MS pelo juiz de primeiro grau
Imagine, por exemplo, que o juiz de primeiro grau conceda habeas corpus e o Ministério Público não recorra.
Trata-se de hipótese que deve o magistrado remeter os autos ao Tribunal para reapreciação e confirmação da decisão.
Ao deferir a reabilitação, reconhece-se que o indivíduo cumpriu integralmente a pena, “apagando-se” tudo que havia na certidão de antecedentes.
Nesse caso, também é necessário enviar de ofício a decisão para o Tribunal reapreciar e confirmar a decisão.
Princípio da Colegialidade
Como regra, recursos criminais são julgados pelo colegiado para:
- Reduzir a ingerência externa.
- Reduzir o risco de erro;
Princípio da Fungibilidade
Segundo o princípio da fungibilidade, o recurso interposto de forma equivocada poderá ser julgado como se fosse o recurso correto.
Para tanto, contudo, é preciso:
- Ausência de má-fé do recorrente;
- Ausência de erro grosseiro;
A comprovação da boa-fé, aqui, é objetiva, ou seja, não depende da análise da intenção do recorrente.
A jurisprudência entende que há má-fé quando o recurso interposto de forma equivocada tem prazo de interposição superior quando comparado com o recurso correto.
Para tanto, contudo, o recorrente precisa ter sido beneficiado por esse prazo suplementar do recurso errado…
Caso contrário, é possível aplicar o princípio da fungibilidade.
Além disso, deve-se aferir se, na interposição do recurso, não houve erro grosseiro.
Fala-se, aqui, em dúvida objetiva quanto ao recurso cabível.
Isso significa que, no meio jurídico, precisa ser constatada uma dúvida quanto ao recurso cabível naquele tipo de situação.
Princípio da Conversão
O princípio da conversão dispõe que o endereçamento errado não impede o conhecimento do recurso.
Diante do erro de endereçamento do recurso, cabe o Poder Judiciário encaminhar o recurso ao órgão competente.
Princípio da Unirrecorribilidade
Segundo o princípio da unirrecorribilidade, cabe apenas um recurso em face de determinada decisão.
Entretanto, há exceções..
É o caso, por exemplo, da decisão que atinge, ao mesmo tempo, lei federal e a Constituição Federal.
Nesse caso, caberá Recurso Especial (para o STJ) e Recurso Extraordinário (para o STF).
Princípio da Taxatividade
Segundo o princípio da taxatividade, NÃO existe recurso criminal inominado.
As espécies de recursos criminais estão, sempre, delimitadas em lei.
Cada recurso criminal tem a sua respectiva regulamentação em lei.
Princípio da “non reformatio in pejus“
A “non reformatio in pejus” é a proibição da reforma da decisão para pior, quando o recurso for interposto EXCLUSIVAMENTE pela defesa.
É o que determina o art. 617 do CPP:
Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.
Note que a situação pode ser piorada quando o tribunal julga recurso da acusação.
Aliás, o Tribunal NÃO pode reconhecer sequer a nulidade absoluta CONTRA o réu, quando NÃO suscitada pela acusação, exceto hipótese de recurso de ofício.
É o que dispõe a súmula 160 do STF:
Súmula 160 do STF: É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício.
Fala-se, aqui, em efeito extensivo.
A doutrina aponta duas modalidades de proibição da reformatio in pejus (proibição da reforma para pior):
- Direta;
- Indireta;
A proibição da reformatio in pejusdireta veda conduta do Tribunal.
O Tribunal, ao apreciar recurso exclusivo da defesa, não pode agravar a pena.
Em paralelo, a proibição da reformatio in pejusindireta proíbe que a situação do acusado seja piorada em nova sentença, caso a anterior tenha sido anulada por recurso exclusivo da defesa.
Imagine, por exemplo, que o juiz fixa 8 anos de pena, mas viola o critério trifásico de dosimetria da pena. A defesa, então, recorre pedindo a anulação da sentença. O Tribunal atende o pedido e determina a elaboração de nova sentença. Nessa nova sentença, respeitando o critério trifásico, o juiz NÃO poderá impor pena superior a 8 anos, pois estaria violando o princípio da reformatio in pejus de forma INDIRETA.
Diante desse cenário, a doutrina e jurisprudência chegaram a conclusão que a primeira sentença, ainda que invalida, mantém o efeito limitador, pois limita a pena da segunda sentença.
Fala-se, aqui, em efeito prodrômico da primeira sentença.
O efeito limitador existe, inclusive, quando a decisão é proferida por juiz absolutamente incompetente.
Aliás, tem-se a jurisprudência tem entendido que o efeito limitador aplica-se, inclusive, na primeira sentença do Tribunal do Júri, ainda que presente o princípio da soberania dos veredictos.
Isso significa que, na hipótese da defesa por recurso anular a sentença do júri, o novo júri não pode proferir decisão, cuja pena supera aquela que foi estabelecida a priori.
Princípio da “reformatio in melius“
Trata-se do oposto da proibição da reformatio in pejus.
Segundo o princípio da reformatio in melius, o Tribunal, ao julgar recurso da acusação, pode decisão melhorando a condição do réu/ acusado, ainda que o julgamento seja extrapetita (fora do pedido do recurso da acusação).
Aliás, o Tribunal pode conceder, de ofício, habeas corpus, motivo pelo qual pode, também, julgar extrapetita para beneficiar o réu.
Princípio da Complementaridade
Trata-se de desdobramento do contraditório.
Segundo o princípio da complementaridade, pode o recorrente complementar o recurso, diante da alteração/ complementação da decisão impugnada.
Imagine, por exemplo, que o advogado interponha recurso de apelação contra a sentença do juiz. Contudo, o juiz, deferindo embargos declaratórios, altera a decisão.
Nesse caso, a decisão impugnada sofreu alterações, motivo pelo qual pode o recorrente complementar o recurso de apelação interposto.