Ação Penal Pública: Classificação (Processo Penal)

A ação penal de iniciativa pública poderá ser:

  1. Incondicionada;
  2. Condicionada a representação;

Vou explicar cada uma delas nos próximos tópicos.

Ação Penal de Iniciativa Pública Incondicionada

Trata-se de uma ação penal que NÃO depende da manifestação de vontade/ autorização para o início.

Em outras palavras, o Ministério Público pode iniciar a ação sem depender da vontade ou da representação da vítima ou de qualquer outra pessoa.

Como regra, o crime será de ação penal de iniciativa pública incondicionada.

Por isso, inclusive, diante de crime de ação penal pública incondicionada, o Inquérito Policial deve ser iniciado de ofício (art. 5°, I, do CPP).

Excepcionalmente, a ação penal de iniciativa pública será condicionada a manifestação de vontade de alguém.

Portanto, tratando-se de exceção, depende de previsão legal.

Eventual omissão legislativa, impõe, como conclusão, que o crime será de ação penal pública incondicionada.

Ação Penal de Iniciativa Pública Condicionada

Em alguns casos, o legislador teve o objetivo de evitar o escândalo/ repercussão, condicionando, tal efeito, a vontade da vítima.

Em outras palavras, a vítima (ou outra pessoa interessada definida em lei) passa a ter o controle sobre o início (ou não) da ação penal.

Fala-se, aqui, em ação penal de iniciativa pública condicionada.

Podemos compreender a ação penal de iniciativa pública condicionada como aquela que o Ministério Público só pode iniciar se houver uma autorização prévia de alguém que tenha interesse na persecução penal.

Essa autorização, a depender da espécie de infração penal, pode ser:

  1. A representação da vítima ou de seu representante legal;
  2. A requisição do Ministro da Justiça;

Esse tipo de ação penal se aplica aos crimes que afetam mais diretamente a esfera individual do que a coletiva.

Por isso, há uma espécie de autorização legal para que a vítima opte pela composição civil ou pela renúncia ao direito de queixa.

Trata-se da exceção e, por isso, depende de previsão legal.

Nos próximos tópicos, vou explicar a representação e a requisição.

Representação

A representação da vítima (ou representante legal) na ação penal pública condicionada é um requisito para que o Ministério Público possa oferecer a denúncia contra o autor do crime.

Trata-se de pedido e autorização que condiciona o início da persecução penal.

Aliás, sequer o delegado de polícia pode instaurar inquérito policial sem tal autorização.

É o que dispõe o art. 5°, § 4°, do CPP:

Art. 5° (…)

§ 4°  O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado.

Como já observamos, é uma forma de proteger a intimidade da vítima e evitar que ela seja exposta a um processo indesejado.

A representação, em verdade, é condição de procedibilidade (natureza jurídica).

Conforme art. 24, § 1°, do CPP, na hipótese da morte da vítima, há sucessão processual, podendo representar, no lugar do de cujus:

  1. Cônjuge (ou companheiro na posição do STJ);
  2. Ascendentes;
  3. Descendentes;
  4. Irmão.

Esse rol é preferencial e taxativo.

Fala-se em rol preferencial pois eventual representação do ascendente, por exemplo, dependeria da ausência de cônjuge (ou companheiro na posição do STJ).

Além disso, são destinatários da representação:

  1. Delegado de Polícia;
  2. Ministério Público;
  3. Juiz das garantias;

Note que o Ministério Público pode receber diretamente a representação e, neste cenário, pode:

  1. Requisitar a instauração do inquérito policial;
  2. Instaurar procedimento investigativo criminal (PIC);
  3. Promover o arquivamento da peça de informação;
  4. Oferecer a denúncia no prazo de 15 dias.

Lembro, por oportuno, que o inquérito policial é dispensável, tratando-se de uma das suas características mais marcantes.

Por isso, o Ministério Público, ao receber a representação, pode compreender que, naquele caso, já estão demonstrados a materialidade e autoria, motivo pelo qual pode oferecer a denúncia.

O juiz também poderá ser destinatário da representação, hipótese em que poderia requisitar a instauração de inquérito policial (art. 5°, II, do CPP).

Contudo, a doutrina, alinhada com o sistema acusatório, defende que, nessa situação, deve o juiz abrir vistas ao MP e evitar a requisição de instauração do inquérito policial.

A forma de representação é livre, podendo ocorrer oralmente ou por escrito.

A representação deve ser feita pela própria vítima ou por seu representante legal, no prazo de seis meses, contados do conhecimento da autoria da infração.

É o que dispõe o art. 38 do CPP:

Art. 38.  Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

Trata-se de prazo decadencial, motivo pelo qual não suspende, interrompe ou prorroga.

O dia do conhecimento da autoria deve ser computado, dado que a contagem de prazo, aqui, tem natureza penal.

Como regra, é possível a retratação da representação até a oferta da denúncia pelo Ministério Público.

Após o oferecimento da denúncia pelo Ministério Público, NÃO será admitida a retratação.

Art. 25.  A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.

Entretanto, no âmbito da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06),  diante da prática de crime de ação penal de iniciativa pública condicionada a representação, eventual retratação deve ocorrer em audiência específica na presença do juiz e ouvido o Ministério Público.

Observe o que dispõe o art. 16 da lei 11.340/06:

Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

A retratação, no âmbito da Lei Maria da Penha, pode ocorrer ATÉ o recebimento da denuncia pelo juiz (e não até o oferecimento da denúncia pelo MP).

Aqui, precisamos lembrar que, ao estudar o crime de lesão corporal, explicamos que o crime de lesão corporal leve é, como regra, um crime de ação penal pública condicionada a representação, conforme art. 88 da Lei 9.099 (lei dos juizados).

Ocorre que o art. 41 da Lei Maira da Penha esclarece que “aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099.

Em outras palavras, não se aplica a lei dos juizados nos crimes praticados no âmbito da violência doméstica.

Como consequência, surge a seguinte pergunta: “lesão corporal leve no âmbito da violência doméstica é ação penal pública condicionada a representação ou incondicionada?

Para o STJ, lesão corporal leve, no âmbito da violência doméstica, é crime de ação penal pública incondicionada.

É o que disciplinou a Súmula 542 do STJ:

Súmula 542 do STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada

É importante destacar que a representação do ofendido não vincula o Ministério Público.

Neste cenário, o ministério público poderá não oferecer denúncia, ou ainda, poderá oferecer a denúncia classificando o suposto autor do crime em outras infrações penais, desalinhado, portanto, com a representação do ofendido.

Requisição do Ministro da Justiça

A requisição do ministro da justiça pode ser compreendida, no processo penal, como um ato administrativo e político.

Tal ato autoriza o Ministério Público a propor a ação penal contra o autor de certos crimes que afetam a segurança nacional, a honra ou o patrimônio público.

É, assim como a representação, uma condição de procedibilidade (natureza jurídica).

O destinatário da requisição do Ministro da Justiça será o Procurador Geral do Ministério Público.

Diferente da representação, NÃO há prazo para que ocorra a requisição do Ministro da Justiça.

Similar a representação, parte da doutrina sustenta que é possível a retratação por parte do Ministro da Justiça por analogia ao art. 25 do CPP.

Há quem defenda, contudo, que a retratação, nesse caso, é impossível, dado que não há previsão legal.

A requisição não vincula o Ministério Público a denunciar, mas apenas lhe dá essa possibilidade.

Portanto, assim como na representação, aqui também permanece a independência funcional do Ministério Público.

Por isso, é absolutamente inadequado chamar de requisição.

Trata-se, em verdade, de um requerimento em respeito a independência funcional do MP.

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