O contrato por obra certa configura-se como uma modalidade de contrataรงรฃo de trabalho por tempo determinado, cuja peculiaridade reside na execuรงรฃo de um serviรงo ou produรงรฃo de uma obra especรญfica, previamente acordada entre empregado e empregador.
Esta forma de contrato estรก enquadrada dentro das disposiรงรตes da Consolidaรงรฃo das Leis do Trabalho (CLT), particularmente no art. 443, que define os contratos de trabalho por tempo determinado, sendo o contrato por obra certa um dos subtipos que se ajusta ร definiรงรฃo de dependรชncia da realizaรงรฃo de um acontecimento suscetรญvel de previsรฃo aproximada (art. 443 da CLT).
Art. 443. O contrato individual de trabalho poderรก ser acordado tรกcita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestaรงรฃo de trabalho intermitente.
ยง 1ยบ – Considera-se como de prazo determinado o contrato de trabalho cuja vigรชncia dependa de termo prefixado ou da execuรงรฃo de serviรงos especificados ou ainda da realizaรงรฃo de certo acontecimento suscetรญvel de previsรฃo aproximada.
(…)
A legislaรงรฃo brasileira, por meio da Lei n. 2.959, de 17 de novembro de 1956, veio a aprofundar o tratamento deste tipo contratual, estabelecendo diretrizes especรญficas para sua execuรงรฃo e conclusรฃo.
Conforme o art. 1ยบ desta lei, quando se trata de um contrato individual de trabalho por obra certa, o construtor, assumindo o papel de empregador, tem a obrigaรงรฃo de realizar as anotaรงรตes pertinentes na carteira profissional do empregado.
Tal disposiรงรฃo reforรงa a formalidade necessรกria para a proteรงรฃo dos direitos trabalhistas e a seguranรงa jurรญdica das relaรงรตes de trabalho, estabelecendo uma clara relaรงรฃo de emprego e suas consequรชncias legais (Lei n. 2.959/56, art. 1ยบ).
Mudanรงas introduzidas pela Lei n. 2.959/56 em relaรงรฃo a CLT
No รขmbito da Lei n. 2.959/56, o art. 1ยบ trouxe um avanรงo na formalizaรงรฃo do contrato por obra certa, impondo que as inscriรงรตes na carteira profissional do empregado fossem feitas pelo construtor, que รฉ, nesse contexto, caracterizado como empregador.
Esse dispositivo legal reforรงou a importรขncia de se registrar oficialmente a relaรงรฃo de emprego, proporcionando uma garantia ao trabalhador de que sua funรงรฃo e o tempo de serviรงo estariam formalmente documentados, o que tambรฉm contribui para a formalizaรงรฃo da economia e para a garantia de direitos previdenciรกrios e trabalhistas (Lei n. 2.959/56, art. 1ยบ).
Com a promulgaรงรฃo do art. 2ยบ da Lei n. 2.959/56, estabeleceu-se que, ao finalizar a obra ou o serviรงo que deu origem ao contrato por obra certa, o empregado com mais de doze meses de serviรงo teria direito a uma indenizaรงรฃo por tempo de trabalho.
Esta indenizaรงรฃo foi estipulada com base no art. 478 da CLT, contudo, com uma reduรงรฃo de 30%.
Essa medida visava equilibrar a compensaรงรฃo devida ao trabalhador pelo tรฉrmino do contrato de trabalho sem que houvesse uma demissรฃo sem justa causa, com a realidade econรดmica do empregador que opera em projetos com prazo determinado para conclusรฃo (Lei n. 2.959/56, art. 2ยบ).
Alรฉm de estabelecer direitos, a Lei n. 2.959/56 tambรฉm previu penalidades para os empregadores que nรฃo cumprissem as novas obrigaรงรตes impostas.
O art. 3ยบ da lei especificou que o empregador que negligenciasse a exigรชncia de inscriรงรฃo na carteira profissional seria sujeito a uma multa variando de CR$ 500,00 a CR$ 5.000,00.
Tal disposiรงรฃo tinha o intuito de assegurar o cumprimento da legislaรงรฃo e proteger os trabalhadores contra a informalidade.
Adicionalmente, estipulou-se a possibilidade de suspensรฃo das atividades do empregador atรฉ que a obrigaรงรฃo legal fosse satisfeita, o que demonstra a seriedade com que o legislador tratou a matรฉria, visando coibir prรกticas desonestas no mercado de trabalho (Lei n. 2.959/56, art. 3ยบ).
Implicaรงรตes da Lei n. 5.107/66 e do Regime do FGTS
A legislaรงรฃo trabalhista brasileira passou por uma significativa evoluรงรฃo com a introduรงรฃo da Lei n. 5.107/66, que instituiu o regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviรงo (FGTS).
Observe que a lei 5.107/66 รฉ posterior a lei 2.959/56 que regulamentou o contrato por obra certaโฆ
Essa nova lei trouxe um mecanismo inovador que alterou a dinรขmica das indenizaรงรตes por rescisรฃo de contrato de trabalho, incluindo as indenizaรงรตes por obra certa.
Antes disso, o art. 478 da CLT previa que os trabalhadores tinham direito a uma indenizaรงรฃo quando seus contratos por obra certa eram rescindidos ao final da obra.
No entanto, com a implementaรงรฃo do FGTS, esse direito foi sendo substituรญdo gradativamente pelos depรณsitos realizados nesse fundo, que passaram a servir como uma garantia para os trabalhadores em caso de demissรฃo sem justa causa.
A substituiรงรฃo da indenizaรงรฃo prevista no art. 478 da CLT pelo FGTS representou uma mudanรงa de paradigma nas relaรงรตes de trabalho no Brasil.
A criaรงรฃo do FGTS foi um avanรงo na proteรงรฃo ao trabalhador, pois alรฉm de funcionar como uma poupanรงa forรงada, que o trabalhador pode acessar em diversas situaรงรตes, tambรฉm serve como uma proteรงรฃo adicional em caso de desemprego involuntรกrio.
Com a Constituiรงรฃo Federal de 1988, o FGTS tornou-se um direito universal para todos os trabalhadores, consolidando a mudanรงa do sistema indenizatรณrio para o regime de garantia de tempo de serviรงo (Constituiรงรฃo de 1988).
Esse novo regime impactou diretamente os contratos por obra certa, jรก que a partir de entรฃo, os trabalhadores sob esse regime nรฃo mais recebiam a indenizaรงรฃo por tempo de trabalho prevista na Lei n. 2.959/56, exceto em casos de direito adquirido.
A partir desse momento, os depรณsitos do FGTS passaram a cumprir o papel de garantir os direitos dos trabalhadores ao tรฉrmino do contrato por obra certa.
Essa alteraรงรฃo legislativa refletiu o esforรงo contรญnuo do legislador brasileiro em modernizar as relaรงรตes trabalhistas e em proporcionar um sistema mais robusto e eficaz de proteรงรฃo ao trabalhador (Lei n. 5.107/66).
Limites Temporais e Sรบmula 195 do STF (Art. 445 da CLT)
O contrato por obra certa, apesar de ser uma modalidade de contrato de trabalho por tempo determinado, nรฃo รฉ imune ร s transformaรงรตes que podem convertรช-lo em um contrato por tempo indeterminado.
O marco legal que estabelece essa possibilidade encontra-se na Consolidaรงรฃo das Leis do Trabalho (CLT).
De acordo com o artigo 445 da CLT, um contrato de trabalho que originalmente foi estabelecido por um perรญodo determinado nรฃo pode exceder o prazo de dois anos.
Caso isso ocorra, o contrato de trabalho รฉ automaticamente transformado em um contrato por tempo indeterminado, garantindo ao trabalhador todos os direitos e benefรญcios inerentes a essa forma de contrataรงรฃo mais estรกvel e duradoura.
Essa conversรฃo automรกtica รฉ uma medida de proteรงรฃo ao trabalhador, evitando que contratos temporรกrios sejam estendidos indefinidamente sem a devida concessรฃo de direitos como estabilidade, fรฉrias, dรฉcimo terceiro salรกrio, entre outros benefรญcios associados aos contratos por tempo indeterminado.
A Sรบmula 195 do Supremo Tribunal Federal (STF) reforรงa essa interpretaรงรฃo, embora deva ser adaptada ร s mudanรงas legislativas ocorridas apรณs sua promulgaรงรฃo.
Sรบmula 195 do STF
Contrato de trabalho para obra certa, ou de prazo determinado, transforma-se em contrato de prazo indeterminado, quando prorrogado por mais de quatro anos.
Inicialmente, a CLT estipulava um limite de quatro anos para os contratos por tempo determinado, mas esse perรญodo foi reduzido para dois anos pelo Decreto-lei n. 229, de 28 de fevereiro de 1967.
A reduรงรฃo desse prazo รฉ um reflexo da evoluรงรฃo da legislaรงรฃo trabalhista e da tendรชncia de maior proteรงรฃo ao trabalhador.
Portanto, รฉ essencial que empregadores e empregados estejam atentos ao prazo do contrato por obra certa para evitar a transformaรงรฃo nรฃo planejada do contrato em indeterminado, o que implica em obrigaรงรตes e direitos adicionais para ambas as partes.