Ação Penal Privada: Princípios (Processo Penal)

Em alguns casos, a infração penal ofende a intimidade de um modo que a própria vítima é quem exerce a ação penal.

Nesse caso, a vítima atua como substituta processual.

Trata-se de substituta processual, pois a vítima atua em nome próprio, mas punição será, ao final, efetuada pelo Estado.

A ação penal de iniciativa privada, então, é aquela em que o titular da ação é o ofendido, ou seja, a vítima ou seu representante legal, sempre na condição de substituto processual.

A vítima (ou seu representante legal) será o querelante ao passo que o réu é o querelado.

A inicial, nesse caso, é denominada queixa-crime.

Princípios da Ação Penal de Iniciativa Privada

São princípios da ação penal de iniciativa privada o:

  1. Princípio da Oportunidade;
  2. Princípio da Pessoalidade (ou intranscendência);
  3. Princípio da Disponibilidade;
  4. Princípio da Indivisibilidade.

Vou falar sobre cada um deles nos próximos tópicos.

Princípio da Oportunidade

O princípio da oportunidade no processo penal é aquele que permite ao titular da ação penal deixar de promover o ius puniendi (direito de punir) quando verificar que dele possam advir mais inconvenientes do que vantagens.

O princípio da oportunidade se contrapõe ao princípio da obrigatoriedade, que vigora na ação penal de iniciativa pública.

Lembre-se que, segundo o princípio da obrigatoriedade, o Ministério Público deve oferecer a denúncia sempre que houver indícios suficientes de autoria e materialidade do crime.

A vítima, diante do conhecimento da autoria da infração, tem 6 meses para ajuizar a queixa-crime (ação penal de iniciativa privada):

Art. 38.  Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

Note que o prazo decadencial e, uma vez verificada a decadência, ocorre a extinção da punibilidade.

Aliás, a vítima pode, inclusive, renunciar ao direito.

A renúncia, aqui, poderá ser:

  1. Expressa: quando a vítima, expressamente, informa que não pretende apresentar queixa-crime;
  2. Tácita: quando a vítima pratica ato incompatível com a queixa-crime (e.g. convida o ofensor para o batizado do seu filho).

Lembro, por oportuno, que a renúncia também extingue a punibilidade (art. 107, V, do CP).

Vale destacar, também, que, conforme art. 57 do CPP, “a renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova“.

Princípio da Pessoalidade (ou Intranscendência)

O princípio da intranscendência disciplina que os efeitos da ação não podem transcender/ ultrapassar a pessoa do réu.

Esse princípio visa garantir que somente o responsável pelo crime sofra as consequências jurídicas de sua conduta, e que seus familiares ou sucessores não sejam afetados pela sanção penal.

Princípio da Disponibilidade

Segundo o princípio da disponibilidade, o ofendido tem a livre escolha para desistir da ação já ajuizada ou do recurso a qualquer momento.

O juiz, neste particular, não pode interferir na decisão do ofendido, salvo nos casos previstos em lei.

A desistência da ação pode ocorrer por meio do :

  1. Perdão;
  2. Perempção;

O perdão é similar ao conceito de renúncia, todavia, no caso do perdão a ação já está em curso.

Neste cenário, o perdão, assim como a renúncia, pode ser expresso ou tácito.

Aliás, o art. 57 do CPP, ao lado da renúncia tácita, também trata do perdão tácito esclarecendo o seguinte:

Art. 57: A renúncia tácita e o perdão tácito admitirão todos os meios de prova.

O perdão tácito ocorre quando, no curso da ação penal, o autor da ação pratica ato incompatível com a manutenção da ação.

É importante destacar que o perdão depende da aceitação do réu.

A aceitação, seguindo a mesma linha do perdão, também poder expressa ou tácita.

A vítima poderá declarar nos autos o perdão, sendo o réu intimado para manifestar-se.

Neste caso, o réu tem 3 dias para declarar se aceita (ou não).

Eventual omissão, implica aceitação tácita por parte do réu.

Essa aceitação poderá ocorrer por meio de procurador, desde que presentes poderes especiais para tal finalidade (art. 55 do CPP).

É muito importante não confundir o perdão da vítima com o perdão judicial.

O perdão judicial é ato unilateral e guarda relação com os crimes de ação penal pública.

Além disso, depende de expressa previsão legal.

O art. 121, § 5º, do CP, por exemplo, autoriza o perdão judicial, no homicídio culposo, na hipótese das consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária.

Em paralelo ao perdão da vítima, a desistência da ação pode ocorrer, também, pela perempção.

Trata-se de sanção imposta aquele que, por desídia, não dá o adequado andamento ao processo.

A perempção, quando verificada, extingue a punibilidade (art. 107, IV, do CPP).

As hipóteses de perempção da ação penal de iniciativa privada estão elencadas no art. 60 do CPP, cumpre citar:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação penal:

I – quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 dias seguidos;

II – quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36;

III – quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais;

IV – quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.

Princípio da Indivisibilidade

O princípio da indivisibilidade no processo penal é um princípio que se aplica à ação penal privada (exclusiva ou subsidiária da pública).

Em síntese, em razão do princípio da indivisibilidade, a queixa deve ser oferecida contra todos os autores e partícipes conhecidos do crime.

Esse princípio visa evitar a impunidade parcial dos responsáveis pelo crime e garantir a igualdade de tratamento entre os acusados.

Cabe ao Ministério Público fiscalizar a indivisibilidade da ação penal de iniciativa privada.

Na hipótese do ofendido, intencionalmente, deixar de incluir algum dos envolvidos na queixa, estará RENUNCIANDO ao direito em favor dos não processados.

Como consequência, há extinção da punibilidade em prol de todos.

Na hipótese do ofendido, contudo, deixar de incluir algum dos envolvidos na queixa por equívoco não há renúncia.

Nesse caso, cabe o Ministério Pública intervir para requerer a inclusão dos sujeitos faltantes.

É o que disciplina o art. 46, § 2°, do CPP:

Art. 46. (…)

§ 2° O prazo para o aditamento da queixa será de 3 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos, e, se este não se pronunciar dentro do tríduo, entender-se-á que não tem o que aditar, prosseguindo-se nos demais termos do processo

É importante destacar, contudo, que prevalece o entendimento de que o MP NÃO poderá incluir mais réus na demanda, pois, na ação penal de iniciativa privada o MP não possui legitimidade ativa “ad causam”.

Uma exceção ao princípio da indivisibilidade ocorre quando o ofendido concede perdão ao acusado, pois nesse caso o perdão só vale para quem o aceita, e não para os demais coautores ou partícipes.

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