O Direito Processual Penal é, em síntese, o ramo autônomo do Direito Público que regula a atividade de jurisdição do Estado e materializa o jus puniendi (direito de punir).
Podemos afirmar, ainda, que o Direito Processual Penal é a disciplina que regulamenta a persecução penal.
A persecução penal, por sua vez, pode ser compreendida como perseguição do crime que subdivide-se em:
- Investigação;
- Processo.
O processo penal, por sua vez, pode ser compreendido como uma sequência de atos destinados a apurar se houve um crime e, em caso afirmativo, que consequências jurídicas deve ter a sua prática.
Dentro desse contexto, é importante lembrar do pacote anticrime (Lei 13.964/19).
O pacote anticrime entrou em vigor em 23 de janeiro de 2020.
Entretanto, o Min. Luiz Fux suspendeu 4 institutos do pacote anticrime (ADI 6.298).
Suspendeu o:
- Juiz das garantias (art. 3°-A ao art. 3°-F do CPP);
- O relaxamento da prisão pela não realização de audiência de custódia dentro do prazo legal (art. 310, § 4º, do CPP);
- Impedimento do juiz por contato com prova ilícita (art. 157, § 5º, do CPP);
- Arquivamento do inquérito dentro do MP (art. 28, caput, do CPP);
O juiz das garantias foi, em momento posterior, declarado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, porém foi bastante desidratado, afastando-se da finalidade do instituto (garantir a imparcialidade do juiz).
O STF também afastou a possibilidade de relaxamento automático da prisão na audiência de custódia, podendo o magistrado, excepcionalmente, prorrogar o prazo ou designar audiência por videoconferência.
Além disso, o STF declarou inconstitucional o art. 157, § 5º, do CPP.
Portanto, o juiz que tem contato com a prova ilícita NÃO está impedido de julgar o processo.
Por fim, quanto ao arquivamento, houve alteração em relação a redação do art. 28 do CPP.
Na prática, a redação original tinha o objetivo de evitar a interferência do magistrado no arquivamento.
Porém, o STF alterou a redação, de modo que, após o julgamento pelo STF, volta o magistrado a ter controle sobre o arquivamento do inquérito policial pelo Ministério Público.
Feita essa análise rápida sobre esses pontos, podemos concluir o que vem a ser o Direito Processual Penal.
É, em síntese, o ramo autônomo do Direito Público que regula a atividade de jurisdição do Estado e materializa o jus puniendi (direito de punir). Participantes processuais são todas as pessoas e entidades que, de alguma forma, atuam no processo.
- Dica: aprenda mais sobre o desdobramento do inquérito policial.
Conceito do Inquérito Policial
O inquérito policial é um procedimento administrativo preliminar com caráter informativo.
Além disso, o inquérito policial será presidido pela autoridade policial.
Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 2°, § 1º, da lei 12.830/13:
Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.
§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.
§ 2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos.
O inquérito policial, ainda, tem o objetivo de apurar:
- Autoria;
- Materialidade;
- Circunstâncias da infração.
Materialidade, aqui, é a existência do crime.
Ao estudar o Direito Penal, já observamos que o crime que deixa vestígios é chamado de crime NÃO transeunte.
Os “vestígios”, neste caso, são a materialidade do crime.
Tais vestígios são chamados de corpo de delito.
Já observamos, por exemplo, que o crime de dano é compreendido pela doutrina como um crime não transeunte, pois é um deixa vestígios.
Em relação aos vestígios do crime/ corpo de delito, o pacote anticrime (lei 13.964/19) inseriu, no Processo Penal, a cadeia de custódia.
Trata-se de um conjunto de procedimentos que tem o objetivo de preservar os vestígios do crime e viabilizar a realização da perícia.
Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 158-A do CPP:
Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte.
§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.
§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação.
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal.
Observe que o § 3º do art. 158-A esclarece o que é vestígio (conceito legal).
O inquérito policial tem prazo e tem por finalidade auxiliar na formação da opinião delitiva do titular da ação.
O titular da ação, como regra, é o Ministério Público.
Portanto, o inquérito policial tem a função de formar o convencimento do Ministério Público, ou seja, a opinião delitiva em relação ao crime cometido.
A partir do inquérito policial, decide o Ministério Público se dá início (ou não) ao processo penal.
Entretanto, é preciso compreender que o inquérito policial também tem a finalidade de fornecer, ao magistrado, indícios para adoção de medidas cautelares no transcorrer da persecução penal.
A doutrina esclarece que tem-se, aqui, a finalidade acidental do inquérito policial.
A finalidade acidental do inquérito policial, portanto, é oferecer ao juiz justa causa para adoção de medidas cautelares
É o que ocorre, por exemplo, quando o magistrado, pautado em indícios alcançados durante o inquérito policial, defere o pedido de interceptação telefônica.
Natureza Jurídica do Inquérito Policial
Como já observamos no conceito, o inquérito policial é compreendido como um procedimento administrativo preliminar de caráter informativo.
Inquéritos NÃO Policiais
São inquéritos presididos por autoridades NÃO policiais.
O primeiro caso bastante conhecido é o inquérito parlamentar.
Trata-se de inquérito conduzido pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 1° da lei 10.001/2000:
Art. 1° Os Presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional encaminharão o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito respectiva, e a resolução que o aprovar, aos chefes do Ministério Público da União ou dos Estados, ou ainda às autoridades administrativas ou judiciais com poder de decisão, conforme o caso, para a prática de atos de sua competência.
A autoridade que receber a resolução deve informar, no prazo de 30 dias, as providências adotadas ou justificativas pela omissão (art. 2° da lei 10.001).
Esse processo ou procedimento terá prioridade sobre qualquer outro, exceto em relação ao habeas corpus, habeas data e mandado de segurança (art. 3° da lei 10.001).
Outro inquérito não policial é o inquérito militar.
O objetivo do inquérito é apurar delitos indicados nos art. 9 e 10 do Código Penal Militar.
Além disso, tal inquérito é conduzido por integrante da própria instituição militar (e não autoridade policial).
O inquérito também não será policial na hipótese do crime ser praticado pelas demais autoridades com foro por prerrogativa.
No entendimento do STF (Inquérito 2.411), a investigação e o indiciamento, nestes casos, dependem da prévia autorização do tribunal competente, muito embora o STJ tenha precedente em sentido contrário, dado que tal exigência não está na Constituição Federal.
Também não será inquérito policial (pois não presidido por autoridade policial) aquele que foi instaurado para apurar a prática de crimes por magistrados.
Trata-se de uma forma de evitar a intervenção do poder executivo no âmbito do poder judiciário.
Segundo a doutrina, a investigação realizada pelo delegado de polícia fere, neste particular, a separação dos poderes.
Por isso, a investigação fica restrita ao tribunal competente, sendo a polícia utilizada apenas para cumprir diligências.
É o que disciplina o art. 33 da LC 75/79:
Art. 33 – São prerrogativas do magistrado:
(…)
Parágrafo único – Quando, no curso de investigação, houver indício da prática de crime por parte do magistrado, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá os respectivos autos ao Tribunal ou órgão especial competente para o julgamento, a fim de que prossiga na investigação.
Da mesma forma, os crimes praticados por membros do Ministério Público serão investigados pela Procuradoria Geral, tratando-se de inquérito não policial, pois não presidido pela autoridade policial.
Sobre o tema, observe o que dispõe o art. 41, parágrafo único da lei 8.625/92:
Art. 41. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica:
(…)
Parágrafo único. Quando no curso de investigação, houver indício da prática de infração penal por parte de membro do Ministério Público, a autoridade policial, civil ou militar remeterá, imediatamente, sob pena de responsabilidade, os respectivos autos ao Procurador-Geral de Justiça, a quem competirá dar prosseguimento à apuração.
No mesmo sentido, observe o que dispõe o art. 18, parágrafo único, da LC 75/93:
Art. 18. São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União:
(…)
Parágrafo único. Quando, no curso de investigação, houver indício da prática de infração penal por membro do Ministério Público da União, a autoridade policial, civil ou militar, remeterá imediatamente os autos ao Procurador-Geral da República, que designará membro do Ministério Público para prosseguimento da apuração do fato.
Neste particular, o fundamento é a proteção da instituição contra eventual intervenção/ retaliação do Poder Executivo.
Ainda no âmbito os inquéritos não policiais, é importante falar do inquérito ministerial.
Uma pergunta bastante importante e que, por algum tempo, tomou conta dos Tribunais Superiores é a seguinte: “poderia o Ministério Público presidir o Inquérito Policial?“.
No entendimento do STF (RE 593.727), o MP pode investigar com fundamento na Teoria dos Poderes Implícitos.
Segundo essa teoria, a Constituição, ao atribuir uma função ou competência a um órgão ou instituição, também lhe concede, de forma implícita, os meios necessários para realizar essa atividade.
Essa teoria é usada para justificar alguns poderes que não estão expressamente previstos na Constituição, mas que decorrem das atribuições constitucionais de certos órgãos ou instituições.
É o que ocorreu, por exemplo, com o poder de investigação do Ministério Público.
Observe que, segundo o art. 129, I, da Constituição Federal, compete ao Ministério Público “promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei“.
Portanto, considerando que o Ministério Público pode promover a ação penal pública, poderá, também, com base na teoria dos poderes implícitos, conduzir a investigação para tanto.