Princípios de Direito do Trabalho

São Princípios específicos do Direito do Trabalho:

  1. Princípio da Proteção;
  2. Princípio da irredutibilidade Salarial;
  3. Princípio da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas;
  4. Princípio da Imperatividade das Normas Trabalhistas;
  5. Princípio da Integridade ou Intangibilidade Salarial;
  6. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego;

Já falamos, nesse blog, dos princípios constitucionais e dos princípios gerais de direito aplicáveis ao Direito do Trabalho.

Aqui, vamos tratar apenas dos princípios específicos de Direito do Trabalho.

Vou explicar, passo a passo, cada um dos princípios.

Princípio da Proteção

O empregado é hipossuficiente na relação jurídica entre empregador/ empregado.

Sendo hipossuficiente, o empregado não possui a mesma liberdade contratual.

Por isso, o Direito Material tem o objetivo de proteger a parte mais frágil da relação.

São subprincípios do princípio da proteção:

  1. in dubiu pro operario” (ou in dubio pro misero);
  2. Norma mais favorável;
  3. Condição mais benéfica.

Segundo o subprincípio do in dubiu pro operario, eventual dúvida quanto a interpretação da norma, deve-se dar preferência a interpretação que melhor beneficia o trabalhador.

Note, portanto, que há uma única norma com mais de uma interpretação.

Pouco importa se a norma é, por exemplo, uma norma legal ou uma norma coletiva (com previsão na convenção coletiva).

Imagine, por exemplo, que existe uma dúvida quanto a interpretação de uma determinada norma coletiva presente na convenção coletiva da categoria do empregado.

É neste cenário que aplicamos o princípio da proteção, beneficiando o trabalhador ao aplicar a interpretação que mais favorece o empregado.

Um ponto importante é que o subprincípio do in dubiu pro operario é um princípio de Direito Material (Direito do Trabalho).

Isso significa que NÃO deve ser utilizado no âmbito do Processo do trabalho (Direito Processual).

Em outras palavras, não se pode usar o in dubiu pro operario, por exemplo, para interpretação das provas do Processo do Trabalho.

Em paralelo, tem-se o subprincípio da norma mais favorável.

Por meio desse subprincípio, existindo MAIS de uma norma, deve-se aplicar a norma mais favorável ao trabalhador.

Note que, aqui, há mais de uma norma e não apenas uma (como ocorria no caso do in dubiu por operario).

O problema do subprincípio da norma mais favorável é que, em alguns casos, uma norma jurídica é, em parte, mais favorável, quando comparada com outra norma jurídica.

Imagine, por exemplo, que existam 2 normas aplicáveis ao caso concreto:

  1. Norma A entrega o benefício de R$200,00 + férias de 50 dias;
  2. Norma B entrega o benefício de R$400,00 + férias de 35 dias;

Note que, em parte, a norma A é mais favorável que a norma B (norma A concede férias de 50 dias e norma B concede férias de 35 dias)

Contudo, em parte, a norma B é mais favorável que a norma A (norma B entrega benefício de R$400,00, ao passo que a norma A entrega apenas R$200,00).

Nesse caso, pergunta-se: “qual é a norma mais favorável?“.

Para resolver esse tipo de problema, surgiram 3 teorias:

  1. Teoria da Acumulação (ou atomista);
  2. Teoria do Conglobamento;
  3. Teoria do Conglobamento Mitigado (ou por instituto);

Pela teoria da acumulação, deve-se somar (acumular) o que há de melhor em cada regra, criando uma espécie de “super regra” que beneficia o trabalhador.

No exemplo, portanto, deve-se criar uma norma C com 50 dias de férias e que concede R$400,00 de benefício.

Na hipótese de normas de hierarquia distinta, deve-se prevalecer a norma mais favorável.

Isso significa que, diante de normas de hierarquia distinta, aplica-se a teoria da acumulação.

Note que não necessariamente prevalece a norma hierarquicamente superior (e.g. a Constituição Federal)…

É possível prevalecer, no caso concreto, a norma infraconstitucional, quando mais favorável ao trabalhador.

Além da teoria da acumulação, a doutrina aponta a teoria do conglobamento.

Deve-se considerar o conjunto da norma…

Segundo a teoria do conglobamento, não se deve “aproveitar” o que há de mais benéfico em uma e o que há de mais benéfico na outra norma.

Deve-se, segundo essa teoria, analisar o “melhor conjunto”.

Diante de normas de mesma hierarquia(e.g. dois regulamentos), adota-se, na prática, a teoria do conglobamento (e não a teoria atomista).

Por fim, existem ainda a teoria do conglobamento mitigado (ou conglobamento por instituto).

Segundo a teoria do conglobamento mitigado, deve-se considerar cada uma das matérias/ institutos, contudo, em seu conjunto.

A teoria do conglobamento mitigado não permite ao interprete, por exemplo, “pincelar” na norma A  regras mais favoráveis de um instituto e somar com regras mais favoráveis da norma B relacionadas ao mesmo instituto.

Isso seria, em verdade, a teoria da acumulação.

Segundo a teoria do conglobamento mitigado, o interprete deve observar o conjunto do instituto da norma A e comparar com o conjunto do instituto da norma B.

Note que o interprete não compara o conjunto da norma (caso da teoria do conglobamento), mas sim o conjunto do instituto.

Seria possível, assim, utilizar, por exemplo, o instituto das férias regulamentado pela norma A (pois mais favorável…) e utilizar o instituto do aviso prévio da norma B (pois mais favorável…).

No Brasil, adotamos a teoria do conglobamento mitigado no caso da lei 7.064/82.

A lei 7.064 trata do trabalhador que, contrato no Brasil, é enviado para o exterior.

É o que dispõe o art. 1 da lei 7.064/82:

Art. 1  Esta Lei regula a situação de trabalhadores contratados no Brasil ou transferidos por seus empregadores para prestar serviço no exterior

Essa norma, expressamente, aplica a teoria do conglobamento mitigado na hipótese do art. 3, II, cumpre citar:

Art. 3º – A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços:

(…)

II – a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em relação a cada matéria.

Note que a norma fala que aplicará a norma mais favorável NO CONJUNTO de normas e EM RELAÇÃO A CADA MATÉRIA.

Fica bastante evidente, portanto, a aplicação da teoria do conglobamento mitigado neste tipo de situação.

Em resumo, na prática, temos o seguinte:

  1. Uma norma, com + de uma interpretação, deve-se aplicar a interpretaçào mais favorável ao trabalhador (in dubiu operario);
  2. Duas ou mais normas de hierarquia distinta (e.g. lei Vs. contrato de trabalho): aplica-se a teoria da acumulação;
  3. Duas ou mais normas de mesma hierarquia (e.g. regulamento Vs. regulamento): aplica-se a teoria do conglobamento;
  4. Lei 7.064/82, art. 3, II: aplica-se a teoria do conglobamento mitigado

Feita essa análise, precisamos agora compreender que há exceções…

O art. 620 do CLT dispõe o seguinte:

Art. 620.  As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho.

Portanto, as regras definidas no acordo coletivo sempre prevalecem quando em conflito com a convenção coletiva, ainda que as normas da convenção coletiva de trabalho sejam mais favoráveis ao trabalhador.

É importante destacar, para fins didáticos, que acordo coletivo é o instrumento normativo acordado entre sindicato e empresa (ou empresas).

Em paralelo, a convenção coletiva é o instrumento normativo assinado entre o sindicato dos trabalhador e o sindicato patronal (sindicato das empresas).

Seguindo a mesma linha de raciocínio, o art. 611-A aponta regra que transcende o subprincípio da norma mais favorável.

Trata-se de hipótese em que o legislador, por opção legislativo, delimita qual regra deve prevalecer, ainda que não seja a mais favorável.

Observe o que dispõe o art. 611-A da CLT:

Art. 611-A.  A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:

I – pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;

II – banco de horas anual;

III – intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas;

IV – adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19 de novembro de 2015;

V – plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de confiança;

VI – regulamento empresarial;

VII – representante dos trabalhadores no local de trabalho;

VIII – teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;

IX – remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado, e remuneração por desempenho individual;

X – modalidade de registro de jornada de trabalho;

XI – troca do dia de feriado;

XII – enquadramento do grau de insalubridade;

XIII – prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho;

XIV – prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em programas de incentivo;

XV – participação nos lucros ou resultados da empresa.

Existem, portanto, temas que, quando estabelecidos em acordo ou convenção coletiva, prevalecem sobre a lei, ainda que a lei aponte norma mais benéfica ao trabalhador.

Há, ainda, outra hipótese prevista na CLT que excepciona o subprincípio da norma mais favorável.

Observe o que dispõe o art. 444, parágrafo único, da CLT:

Art. 444 – As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Parágrafo único.  A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

O que o dispositivo está apontando, então, é que as matérias que estão no art. 611-A da CLT podem prevalecer sobre o que está previsto na Convenção Coletiva, Acordo Coletivo e, inclusive, na lei quando negociadas no contrato individual de trabalho.

Trata-se, contudo, de um caso bastante excepcional em que o trabalhador deve ter:

  1. Diploma de ensino superior e…;
  2. Percebe salário mensal > 2X o limite máximo dos benefícios do Regime geral de Previdência Social.

Por fim, como subprincípio da proteção, tem-se o subprincípio da condição mais benéfica.

Esse subprincípio é também chamado de inalterabilidade contratual lesiva.

Segundo o subprincípio da condição mais benéfica, uma vez firmada condição mais benéfica no contrato de trabalho, eventual alteração posterior poderá ser apenas, como regra, mais benéfica ao empregado.

Sobre o tema, o art. 468 da CLT dispõe o seguinte:

Art. 468 – Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

§ 1  Não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício de função de confiança.

§ 2  A alteração de que trata o § 1 deste artigo, com ou sem justo motivo, não assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício da respectiva função.

Note que o próprio dispositivo elenca algumas exceções nos § 1 e § 2.

Aliás, inclusive cláusulas regulamentares alteradas em prejuízo do  trabalhador atingem apenas trabalhadores posteriormente contratados.

Observe o que dispõe a Súmula 51, item I, do TST, dispõe o seguinte:

Súmula nº 51 do TST

NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 163 da SBDI-1)

I – As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.

(…)

  • Princípio da Irredutibilidade Salarial

Segundo o princípio da irredutubilidade salarial, como é de se presumir, o salário não pode sofrer redução.

Entretanto, admite-se, excepcionalmente, a redução do salário do trabalhador na hipótese de previsão em norma coletiva.

É, inclusive, o que determina o art. 7, VI, da CF:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(…)

VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;

Eventual redução salarial por meio de norma coletiva, contudo, depende de uma contrapartida legal bem específica…

O legislador, nesse particular, impõe a garantia contra dispensa imotivada, durante a vigência da convenção ou acordo coletivo que estabeleceu a redução salarial.

Portanto, não é algo tão simples para o empregador…

sobre o tema, observe o que dispõe o art. 611-A da CLT:

Art. 611-A.  A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:

(…)

§ 3  Se for pactuada cláusula que reduza o salário ou a jornada, a convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho deverão prever a proteção dos empregados contra dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo.

É importante destacar, contudo, que nem sempre a redução salarial implica na violação ao princípio da irredutibilidade salarial.

É o que ocorre, por exemplo, na hipótese do empregado receber salário-condição.

O salário-condição pode ser compreendido como verbas remuneratórias recebidas em razão do trabalho em condições específicas.

É o que ocorre, por exemplo, com o indivíduo que trabalha em condições compreendidas como perigosas.

Tal indivíduo recebe adicional de periculosidade.

Nesse particular, por se tratar de salário-condição, uma vez cessada a periculosidade, é possível retirar o adicional de periculosidade e, como consequência, reduzir eventual remuneração do empregado sem que ocorra violação ao princípio da irredutibilidade salarial.

Isso significa que ao eliminar a condição que autoriza o pagamento do adicional, pode-se, também, eliminar o respectivo adicional.

O mesmo ocorre com outros adicionais como, por exemplo, o adicional de insalubridade e o adicional noturno.

Aliás, sobre o tema, a súmula 248 e 265 do TST disciplinam o seguinte:

Súmula nº 248 do TST

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. DIREITO ADQUIRIDO

A reclassificação ou a descaracterização da insalubridade, por ato da autoridade competente, repercute na satisfação do respectivo adicional, sem ofensa a direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade salarial.

Súmula nº 265 do TST

ADICIONAL NOTURNO. ALTERAÇÃO DE TURNO DE TRABALHO. POSSIBILIDADE DE SUPRESSÃO

A transferência para o período diurno de trabalho implica a perda do direito ao adicional noturno.

  • Princípio da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas

Segundo esse princípio, não se admite, como regra, a renúncia ou transação de direitos trabalhistas que impliquem piora das condições para o trabalhador.

Isso ocorre porque normas trabalhista possuem natureza cogente (norma de ordem pública).

Além disso, diante da hipossuficiência do trabalhador, compreende-se a vontade do trabalhador como limitada/ restrita.

Existem hipóteses em que se admite a mitigação/ relativização do princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas.

É o que ocorre, por exemplo, quando o empregado opta por um regulamento da empresa em detrimento do outro.

Nesse caso, há renúncia as regras do regulamento que não foi opção do trabalhador.

Sobre o tema, observe o que dispõe a súmula 51 do TST:

Súmula nº 51 do TST

NORMA REGULAMENTAR. VANTAGENS E OPÇÃO PELO NOVO REGULAMENTO. ART. 468 DA CLT (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 163 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

(…)

II – Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro.

Isso ocorre porque, nesse caso, estamos diante de normas de mesma hierarquia (regulamento vs. regulamento).

Como já observamos anteriormente, diante de norma de mesma hierarquia, aplica-se a teoria do conglobamento.

Segundo a teoria do conglobamento, não se deve “aproveitar” o que há de mais benéfico em uma e o que há de mais benéfico na outra norma.

Deve-se, segundo essa teoria, analisar o “melhor conjunto”.

Nesse particular, cabe ao trabalhador escolher o melhor conjunto.

Por isso, a Súmula 51, II, do TST admite a renúncia diante da escolha do trabalhador.

A renúncia ou transação ao direito diante da transação que ocorre em juízo é também hipótese de mitigação do princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas.

Aqui, pouco importa se a transação é judicial ou extrajudicial (homologada em juízo).

Isso porque a hipossuficiência, fundamento da irrenunciabilidade, é mitigada em juízo, dado que o magistrado e, eventualmente, os advogados, suprimem essa deficiência do trabalhador.

Isso significa que o magistrado pode, inclusive, negar a homologação de eventual acordo que, por exemplo, viola direito indisponível que, por exemplo, prejudica a saúde do trabalhador.

Sobre a transação extrajudicial, o art. 652, alínea “f”, da CLT dispõe o seguinte:

Art. 652.  Compete às Varas do Trabalho:

(…)

f) decidir quanto à homologação de acordo extrajudicial em matéria de competência da Justiça do Trabalho

  • Princípio da Imperatividade das Normas Trabalhistas

As normas trabalhistas são normas de ordem pública, motivo pelo qual não podem ser afastadas sequer pela vontade do trabalhador.

Sobre o tema, o art. 9º da CLT dispõe o seguinte:

Art. 9º – Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

No mesmo sentido caminha o art. 444 da CLT:

Art. 444 – As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Parágrafo único.  A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

Note que o legislador, com a reforma de 2017, aponta o art. 611-A como exceção a regra.

Configura exceção a hipótese que já estudamos no art. 444 da CLT.

Trata-se do trabalhador que tem:

  1. Diploma de ensino superior e…;
  2. Percebe salário mensal > 2X o limite máximo dos benefícios do Regime geral de Previdência Social.

Neste caso específico, segundo o art. 444, parágrafo único, da CLT, então, as matérias que estão no art. 611-A da CLT podem prevalecer sobre o que está previsto na Convenção Coletiva, Acordo Coletivo e, inclusive, na lei quando negociadas no contrato individual de trabalho.

Há, ainda, hipóteses que a lei admite, expressamente, a disposição de direito.

A doutrina chama esse tipo de norma de norma dispositiva.

  • Princípio da Integridade (ou Intangibilidade Salarial)

Segundo o princípio da integridade, como regra, não pode ocorrer descontos no salário do empregado.

Sobre o tema, o art. 462 da CLT dispõe o seguinte:

Art. 462 – Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo.

(…)

Há, também em relação a esse princípio, exceções…

Três delas, inclusive, surgem no próprio caput do art. 462 da CLT:

  1. Adiantamentos;
  2. Dispositivo de lei;
  3. Contrato coletivo.

A lei, em alguns casos, autoriza o desconto.

É neste cenário que o art. 462 da CLT esclarece que é possível o desconto de estar previsto em “dispositivo de lei”.

Também é possível o desconto quando a norma coletiva autoriza.

É o que ocorre, por exemplo, na autorização proveniente do acordo coletivo ou convenção coletiva.

Isso é o que pretende o art. 462 da CLT quando fala em “contrato coletivo”.

Por isso, inclusive, a OJ 251 da SDI-I do TST autoriza o desconto salarial do frentista que recebe cheque sem fundos em desrespeito aquilo que foi apontando no instrumento coletivo.

Orientação Jurisprudencial 251/TST-SDI-I – Salário. Desconto salarial. Posto de gasolina. Frentista. Cheques sem fundos. CLT, art. 462. CF/88, art. 7º, XXVI.

É lícito o desconto salarial referente à devolução de cheques sem fundos, quando o frentista não observar as recomendações previstas em instrumento coletivo.

Também é possível o desconto quando o empregado causar dano, desde que:

  1. Acordado entre as partes ou…
  2. Dolo do empregado.

Art. 462 (…)

§ 1º – Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde de que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado.

Muito embora não esteja expresso no art. 462 da CLT, também é possível o desconto de planos de saúde, odontológicos, dentre outros, desde que o trabalhador, voluntariamente, opte por receber o benefício:

  1. Com autorização prévia;
  2. Por escrito.

Sobre o tema, observe o que dispõe a Súmula 342 do TST:

SUMULA Nº 342 – DESCONTOS SALARIAIS. ART. 462 DA CLT

Descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o disposto no art. 462 da CLT, salvo se ficar demonstrada a existência de coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico.

Note que, ao final, a súmula 342 do TST esclarece que poderia o trabalhador, em tese, receber tais valores na justiça “se ficar demonstrada a existência de coação ou outro defeito que vicie o ato jurídico“.

Portanto, demonstrando a coação ou vício de consentimento, pode o trabalhador reaver os valores pagos.

Esse vício/ coação, contudo, não pode ser presumido pelo fato da contratação.

Imagine, por exemplo, que o empregado sustente, na justiça do trabalho, que foi obrigado a assinar os papeis que autorizavam o desconto do plano de saúde, sob pena de não ocorrer a contratação.

Esse tipo de argumento é vedado pela jurisprudência.

É o que disciplina a OJ 160 da SDI-I do TST:

Orientação Jurisprudencial 160/TST-SDI-I – – Salário. Descontos salariais. Autorização no ato da admissão. Validade. CLT, art. 462.

É inválida a presunção de vício de consentimento resultante do fato de ter o empregado anuído expressamente com descontos salariais na oportunidade da admissão. É de se exigir demonstração concreta do vício de vontade.

  • Princípio da Continuidade da Relação de Emprego

Segundo o princípio da continuidade da relação de emprego, a regra é o contrato de trabalho por prazo indeterminado.

Isso significa que, ao interpretar a norma jurídica, o operador do direito deve ater-se a manutenção/ preservação do emprego.

Em outras palavras, os contratos por prazo determinado são exceção.

Há inúmeras formas de aplicar o princípio da continuidade da relação de emprego.

Em razão deste princípio, por exemplo:

  1. Há presunção relativa que o contrato de trabalho é por prazo indeterminado;
  2. O juiz deve buscar a eliminação de nulidades relativas nulidades com o objetivo de manter o vínculo de emprego;
  3. O juiz presume (presunção relativa) a demissão sem justa causa, devendo qualquer outra ser comprovada na justiça (ônus da prova);
  4. Manutenção do Vínculo Empregatício na Sucessão Trabalhista;

Imagine, por exemplo, que a pessoa é contratada e, após 60 dias, ajuíza ação buscando alguns direitos trabalhistas na justiça.

O empregador, então, como tese defensiva, sustenta que o contrato de trabalho da parte era, em verdade, um contrato de experiência.

Nesse caso, cabe ao empregador comprovar, pois tem-se, em prol do empregado, o princípio da continuidade da relação de emprego, presumindo-se que o contrato, em verdade, é por prazo indeterminado.

A doutrina fala, aqui, em presunção de indeterminação do contrato.

Ainda em razão desse princípio, o juiz deve buscar a eliminação de nulidades relativas nulidades com o objetivo de manter o vínculo de emprego.

Note que apenas nulidades relativas (e não absolutas) podem ser sanadas/ eliminadas.

Imagine, por exemplo, que um menor, com 17 anos, esteja trabalhando após as 22h00 (trabalho noturno).

Nesse caso, trata-se de nulidade relativa, sendo viável a convalidação do vício para manutenção do contrato de trabalho, desde que o menor, com 17 anos, passe a trabalhar no horário adequado.

O trabalho noturno, nessa situação, é trabalho expressamente vedado pelo art. 404 da CLT:

Art. 404 – Ao menor de 18 (dezoito) anos é vedado o trabalho noturno, considerado este o que for executado no período compreendido entre as 22 (vinte e duas) e as 5 (cinco) horas.

Essa vedação, inclusive, tem fundamento constitucional:

Art. 7° (…)

XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;   

Contudo, a nulidade será absoluta na hipótese do menor, com 15 anos, estar trabalhando.

Isso porque o próprio art. 7°, XXXIII, da Constituição Federal veda QUALQUER trabalho a menores de 16 anos.

O princípio da continuidade da relação de emprego também pode servir de parâmetro para fixação do ônus da prova.

Segundo essa ideia, tem-se que, durante a fixação do ônus da prova, deve-se presumir que o trabalhador tem interesse em permanecer no emprego (e não sair do emprego).

Eventual encerramento do contrato de trabalho de trabalho, portanto, é, presumivelmente, sem justa causa.

Imagine, por exemplo, que o empregado deixa de prestar serviços, ou seja, para de ir para a empresa.

Durante um processo judicial, então, a empresa informa que o empregado não presta mais serviços e que ele pediu demissão.

Sem provas, a empresa será, fatalmente, condenada no pagamento de verbas rescisórias, dado que, em prol do empregado milita o princípio da continuidade da relação de emprego.

Nesse cenário, ao interpretar as provas, o juiz não pode presumir que o empregado pediu demissão, devendo a empresa comprovar tal fato.

Dai porque a fixação do ônus da prova tem como parâmetro o princípio da continuidade da relação de emprego.

É o que dispõe, inclusive, a Súmula 212 do TST:

SÚMULA Nº 212 – DESPEDIMENTO. ÔNUS DA PROVA

O ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado.

A justa causa ou a demissão a pedido, portanto, devem ser comprovada nos autos.

Tal presunção, como é de se pressupor é relativa, pois admite prova em contrário.

Também em razão do princípio da continuidade da relação de emprego, presume-se a manutenção do vínculo trabalhista do empregado na hipótese de sucessão trabalhista.

Para tanto, basta demonstrar a continuidade da prestação de serviços pelo empregado e a sucessão trabalhista.

Sobre o tema, os art. 10 e 448, ambos da CLT, dispõem o seguinte:

Art. 10 – Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.

Art. 448 – A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.

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