A prova testemunhal รฉ um elemento essencial no processo judicial, especialmente no รขmbito trabalhista. Ela รฉ regulamentada pelo Cรณdigo de Processo Civil (CPC) e pela Consolidaรงรฃo das Leis do Trabalho (CLT), com diretrizes especรญficas que orientam sua admissibilidade e procedimentos.
Conforme o art. 442 do CPC, “a prova testemunhal รฉ sempre admissรญvel, nรฃo dispondo a lei de modo diverso”. Alรฉm disso, o art. 443 estabelece que o juiz deve indeferir a inquiriรงรฃo de testemunhas sobre fatos jรก provados por documento ou confissรฃo da parte, ou que sรณ por documento ou por exame pericial puderem ser provados. Assim sendo, a oitiva de testemunhas รฉ desnecessรกria quando os fatos jรก estรฃo suficientemente comprovados por outros meios.
No que tange ร limitaรงรฃo de testemunhas, a CLT estabelece limites especรญficos para o nรบmero de testemunhas que cada parte pode apresentar. Conforme o art. 821, “cada uma das partes nรฃo poderรก indicar mais de 3 (trรชs) testemunhas, salvo quando se tratar de inquรฉrito, caso em que esse nรบmero poderรก ser elevado a 6 (seis)”. Entretanto, no procedimento sumarรญssimo, conforme o art. 852-H, “as testemunhas, atรฉ o mรกximo de duas para cada parte, comparecerรฃo ร audiรชncia de instruรงรฃo e julgamento independentemente de intimaรงรฃo”.
A respeito da intimaรงรฃo de testemunhas, a regra geral no processo do trabalho รฉ que as testemunhas compareรงam ร audiรชncia independentemente de intimaรงรฃo. O art. 825 da CLT afirma que “as testemunhas comparecerรฃo a audiรชncia independentemente de notificaรงรฃo ou intimaรงรฃo”. Todavia, caso nรฃo compareรงam, podem ser intimadas ex officio ou a requerimento da parte, ficando sujeitas a conduรงรฃo coercitiva e outras penalidades previstas no art. 730 da CLT.
E se houver litisconsรณrcio, por exemplo, ativo (vรกrios empregados)? Como fica o nรบmero de testemunhas?
A CLT nรฃo prevรช alteraรงรฃo do nรบmero de testemunhas. Na verdade, na prรกtica, a CLT foi omissa em relaรงรฃo ao limite de testemunhas quando hรก litisconsรณrcio.
Portanto, no processo do trabalho, ainda que tenha mais de um autor, o nรบmero de testemunhas continua limitado a trรชs por processo.
Vale lembrar que a reclamatรณria individual plรบrima (com vรกrios autores) รฉ uma faculdade da parte e, por isso, os autores devem levar esse ponto em consideraรงรฃo.
Em casos complexos, com instruรงรฃo probatรณria mais difรญcil de ser realizada, pode ser mais interessante o ajuizamento individual (uma aรงรฃo por empregado), a fim de garantir uma instruรงรฃo mais adequada.
Parte da doutrina sustenta que o Juiz do Trabalho nรฃo estรก limitado a um nรบmero mรกximo de testemunhas.
โArt. 765 – Os Juรญzos e Tribunais do Trabalho terรฃo ampla liberdade na direรงรฃo do processo e velarรฃo pelo andamento rรกpido das causas, podendo determinar qualquer diligรชncia necessรกria ao esclarecimento delas.โ
A ideia que se tem รฉ que, na prรกtica, na busca pela verdade, o Juiz pode ouvir testemunhas que excedam o nรบmero mรกximo legal.
Essas testemunhas adicionais serรฃo ouvidas como testemunhas do juรญzo.
Por outro lado, o artigo 821 da CLT estabelece um limite mรกximo de testemunhas para cada parte, nรฃo para o Juiz.
Segundo a jurisprudรชncia, em situaรงรตes excepcionais, para garantir o acesso ร justiรงa, como quando o reclamante trabalhou em vรกrios locais, o Juiz pode permitir, de forma fundamentada, que a parte ouรงa mais de trรชs testemunhas.
Outro ponto relevante รฉ o compromisso espontรขneo.
A parte pode comprometer-se a levar suas testemunhas espontaneamente ร audiรชncia, dispensando a intimaรงรฃo pelo juรญzo. Esse compromisso, se nรฃo cumprido, implica desistรชncia tรกcita da oitiva da testemunha. A jurisprudรชncia confirma que, caso a parte se comprometa a levar a testemunha e esta nรฃo compareรงa, presume-se a desistรชncia da inquiriรงรฃo, conforme art. 455, ยง 2ยบ do CPC de 2015.
A questรฃo do cerceamento de defesa รฉ frequentemente debatida. A falta de comparecimento espontรขneo das testemunhas e o indeferimento da intimaรงรฃo pelo juiz nรฃo configuram cerceamento de defesa se a parte nรฃo apresentou o rol de testemunhas no prazo estipulado. A jurisprudรชncia do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem diversas decisรตes que reafirmam esse entendimento, garantindo que a nรฃo intimaรงรฃo das testemunhas, apรณs prazo concedido para apresentaรงรฃo do rol, nรฃo caracteriza cerceamento de defesa.
No caso de testemunhas que sรฃo servidores pรบblicos ou militares, hรก procedimentos especรญficos para intimaรงรฃo.
O art. 823 da CLT estabelece que “se a testemunha for funcionรกrio civil ou militar, e tiver de depor em hora de serviรงo, serรก requisitada ao chefe da repartiรงรฃo para comparecer ร audiรชncia marcada”. Este procedimento visa garantir que o depoimento nรฃo interfira nas funรงรตes pรบblicas ou militares do depoente.
Durante a oitiva da testemunha, no CPC, as perguntas sรฃo feitas diretamente pelas partes (art. 459). Contudo, no processo do trabalho, a inquiriรงรฃo deve ser intermediada pelo juiz, conforme o art. 820 da CLT. As testemunhas devem ser tratadas com urbanidade, e perguntas impertinentes ou vexatรณrias sรฃo proibidas.
Antes de prestar depoimento, a testemunha deve ser qualificada, declarando seus dados pessoais e eventuais relaรงรตes com as partes (CPC, art. 457). A parte pode contraditar a testemunha, alegando incapacidade, impedimento ou suspeiรงรฃo. Provada a contradita, o juiz pode dispensar a testemunha ou tomar seu depoimento como informante (CPC, art. 457, ยง 2ยบ).
As testemunhas tรชm o direito de se recusar a depor sobre fatos que possam causar dano a si mesmas ou a seus familiares prรณximos, ou sobre fatos cobertos por sigilo profissional (CPC, art. 448). Devem prestar compromisso de dizer a verdade e podem ser multadas por litigรขncia de mรก-fรฉ se alterarem a verdade dos fatos intencionalmente (CLT, art. 793-D).
Nรฃo podem depor como testemunhas, entre outros, os menores de 16 anos e os interessados diretos no litรญgio (CPC, art. 447). Alรฉm disso, o Cรณdigo Civil (CC) (art. 228) tambรฉm lista outros impedimentos, como o cรดnjuge e parentes prรณximos das partes. Contudo, hรก exceรงรตes quando a prova do fato depender exclusivamente do depoimento dessas pessoas.
A contradita da testemunha รฉ o ato de impugnar a idoneidade de uma testemunha. Se uma testemunha for contraditada, suas alegaรงรตes devem ser verificadas, e, se negadas, a parte que apresentou a contradita deve provar suas alegaรงรตes. Caso provada a contradita, o depoimento pode ser tomado como informante.
A Sรบmula 357 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabelece que “Nรฃo torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador.” Portanto, mesmo que uma testemunha tenha litรญgios contra o empregador, isso nรฃo a torna automaticamente suspeita. Para provar suspeiรงรฃo por troca de favores, deve-se apresentar evidรชncias concretas.
Um ponto importante รฉ o depoimento de testemunhas que nรฃo falam a lรญngua nacional. Conforme o art. 819 da CLT, “o depoimento das partes e testemunhas que nรฃo souberem falar a lรญngua nacional serรก feito por meio de intรฉrprete nomeado pelo juiz ou presidente”. Isso se aplica tambรฉm aos surdo-mudos que nรฃo saibam escrever. Todavia, as despesas decorrentes dessa traduรงรฃo serรฃo arcadas pela parte sucumbente, salvo se beneficiรกria da justiรงa gratuita. ร fundamental notar que, mesmo que o juiz fale a lรญngua estrangeira, รฉ necessรกria a participaรงรฃo do intรฉrprete, garantindo a precisรฃo e a imparcialidade da traduรงรฃo.
Outro aspecto relevante รฉ a ordem de inquiriรงรฃo das testemunhas. O art. 456 do Cรณdigo de Processo Civil (CPC) estabelece que “o juiz inquirirรก as testemunhas separada e sucessivamente, primeiro as do autor e depois as do rรฉu”. Isso visa evitar a contaminaรงรฃo dos depoimentos. Contudo, o juiz pode alterar essa ordem se houver concordรขncia das partes. Em certas situaรงรตes, o รดnus da prova pode influenciar a ordem dos depoimentos. Por exemplo, se o รดnus da prova for do rรฉu, suas testemunhas devem ser ouvidas antes, como contraprova ร s testemunhas do autor.
A localizaรงรฃo da oitiva das testemunhas รฉ tambรฉm regulamentada. De acordo com o art. 449 do CPC, “as testemunhas devem ser ouvidas na sede do juรญzo”. No entanto, quando a parte ou a testemunha, por enfermidade ou outro motivo relevante, estiver impossibilitada de comparecer, o juiz pode designar dia, hora e local para a inquiriรงรฃo, inclusive em uma audiรชncia extraordinรกria prรณxima ao local da testemunha. Alรฉm disso, o art. 453 do CPC reforรงa que “as testemunhas depรตem, na audiรชncia de instruรงรฃo e julgamento, perante o juiz da causa”, exceto aquelas que prestam depoimento antecipadamente ou por carta.
Em casos onde a testemunha reside em comarca diferente, o depoimento pode ser realizado por videoconferรชncia. Conforme o art. 453, ยง 1ยบ do CPC, “a oitiva de testemunha que residir em comarca diversa poderรก ser realizada por meio de videoconferรชncia”. Isso รฉ uma faculdade, nรฃo um dever, mas os juรญzos devem manter o equipamento necessรกrio para essa modalidade.
Certas autoridades possuem o privilรฉgio de serem inquiridas em suas residรชncias ou locais de trabalho, segundo o art. 454 do CPC. Este artigo lista diversas autoridades, como o presidente e o vice-presidente da Repรบblica, ministros de Estado, e outros altos cargos, que podem indicar dia, hora e local para serem inquiridos.
A documentaรงรฃo dos depoimentos รฉ essencial para a integridade do processo. O parรกgrafo รบnico do art. 828 da CLT dispรตe que “os depoimentos das testemunhas serรฃo resumidos, por ocasiรฃo da audiรชncia, pelo secretรกrio da Junta ou funcionรกrio designado, devendo a sรบmula ser assinada pelo presidente do Tribunal e pelos depoentes”.
O art. 852-F da CLT, em relaรงรฃo ao procedimento sumarรญssimo, complementa que “na ata de audiรชncia serรฃo registrados resumidamente os atos essenciais, as afirmaรงรตes fundamentais das partes e as informaรงรตes รบteis ร soluรงรฃo da causa trazidas pela prova testemunhal”.
Alรฉm disso, o art. 460 do CPC permite que “o depoimento poderรก ser documentado por meio de gravaรงรฃo”, assegurando um registro fiel e detalhado do que foi dito.
Por fim, a acareaรงรฃo de testemunhas รฉ uma ferramenta que pode ser utilizada quando hรก divergรชncias significativas entre os depoimentos.
Conforme o art. 461 do CPC, “o juiz pode ordenar, de ofรญcio ou a requerimento da parte, a acareaรงรฃo de 2 (duas) ou mais testemunhas ou de alguma delas com a parte”. Essa acareaรงรฃo pode ocorrer inclusive por videoconferรชncia.