Antes de mais nada, é importante diferenciar a exclusão do crédito tributário de outros institutos como a suspensão e a extinção. Enquanto a suspensão impede temporariamente a exigibilidade do crédito tributário, e a extinção o elimina definitivamente, a exclusão atua de forma preventiva, impedindo que o crédito tributário seja constituído desde o início.
O crédito tributário, neste particular, pode ser afastado em razão de isenção ou anistia.
Vamos, a partir de agora, estudar cada uma dessas espécies.
Isenção
A isenção é um benefício fiscal que exime o contribuinte do pagamento de determinado tributo. Ela impede que o crédito tributário seja lançado, ou seja, a obrigação tributária não se concretiza em um crédito exigível. Segundo o Código Tributário Nacional (CTN), em seu artigo 175, a exclusão do crédito tributário ocorre por meio da isenção ou da anistia.
É crucial distinguir entre isenção e anistia. A isenção aplica-se a tributos, enquanto a anistia refere-se a penalidades decorrentes de infrações tributárias. A anistia perdoa a infração cometida, extinguindo a penalidade aplicável. Portanto, não há anistia de tributos como IPTU ou ICMS, mas sim de multas ou outras sanções decorrentes de infrações fiscais.
A concessão da isenção depende de lei específica, conforme determina a Constituição Federal no artigo 150, §6º:
“Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só pode ser concedido mediante lei específica…”
Isso significa que a isenção deve ser prevista em lei que trate exclusivamente desse benefício, especificando as condições, os requisitos e os tributos aos quais se aplica. Não é suficiente que esteja prevista em contratos ou outros instrumentos normativos; a lei é indispensável.
A isenção deve ser interpretada de forma literal, conforme estabelece o artigo 111, inciso II, do CTN:
“Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre… outorga de isenção.”
Dessa forma, os benefícios fiscais não podem ser ampliados por interpretação extensiva. A isenção concedida para um tributo não se estende automaticamente a outros, nem se aplica a situações não expressamente previstas em lei.
Limitações da Isenção
Segundo o artigo 177 do CTN, a isenção não se estende a taxas e contribuições de melhoria, salvo se a lei dispuser em contrário. Isso significa que, mesmo que um contribuinte seja isento de um imposto, ele ainda pode ser obrigado a pagar taxas ou contribuições de melhoria relacionadas ao mesmo fato gerador, a menos que a lei expressamente preveja a isenção também para esses tributos.
Além disso, a isenção não se aplica a tributos instituídos após a sua concessão. Ou seja, se um novo tributo for criado, a isenção anterior não o abrange automaticamente.
Revogação da Isenção
A isenção pode ser revogada ou modificada por meio de lei, observando-se os princípios constitucionais, como a anterioridade. O artigo 178 do CTN estabelece:
“A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo.”
Isso significa que isenções concedidas sem prazo determinado ou sem condições específicas podem ser alteradas ou revogadas livremente pelo legislador. Entretanto, as isenções concedidas por prazo certo e sob condição — conhecidas como isenções onerosas — gozam de proteção jurídica.
Isenção Onerosa e Direito Adquirido
As isenções onerosas são aquelas concedidas mediante o cumprimento de certas condições pelo contribuinte e por um período previamente estabelecido. A Súmula 544 do Supremo Tribunal Federal reforça essa proteção:
“Isenções tributárias concedidas, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas.”
Nesse caso, a revogação da isenção antes do término do prazo estabelecido ou sem o descumprimento das condições pactuadas pode ferir o princípio da segurança jurídica e o direito adquirido do contribuinte.
Impacto da Reforma Tributária
Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023, que reformou o sistema tributário nacional, ocorreram mudanças significativas quanto às isenções, especialmente relacionadas ao ICMS. A emenda prevê a extinção gradual do ICMS e a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).
Para mitigar os impactos sobre as empresas que possuem isenções onerosas de ICMS, foi instituído um fundo de compensação. O artigo 12 da Emenda Constitucional nº 132/2023 estabelece:
“Fica instituído fundo com vistas a compensar, entre 1º de janeiro de 2029 e 31 de dezembro de 2032, as pessoas jurídicas beneficiárias de isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS, concedidos por prazo certo e em função de determinadas condições…”
Esse fundo tem por objetivo compensar as perdas decorrentes da transição para o novo sistema tributário, garantindo segurança jurídica às empresas que investiram com base nos incentivos fiscais concedidos.
Isenção em Caráter Individual e Geral
As isenções podem ser concedidas em caráter geral ou individual. A isenção geral aplica-se a todos os contribuintes que se enquadrem nas condições previstas em lei, sem necessidade de requerimento específico. Já a isenção individual depende de solicitação do contribuinte e comprovação do cumprimento das condições estabelecidas.
O artigo 179 do CTN dispõe:
“A isenção, quando não concedida em caráter geral, é efetivada, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento com o qual o interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei ou contrato para sua concessão.”
Portanto, para obter a isenção individual, o contribuinte deve apresentar um requerimento e comprovar que atende aos requisitos legais.
Perda da Isenção por Descumprimento de Condições
Caso o contribuinte deixe de cumprir as condições que justificaram a concessão da isenção individual, esta poderá ser revogada. O artigo 155, inciso I, do CTN prevê:
“O crédito tributário não se extingue e a isenção ou remissão não gera direito adquirido quando concedida por ato administrativo ou norma inconstitucional ou ilegal.”
Assim, se for constatado que o contribuinte não cumpria os requisitos no momento da concessão ou deixou de cumpri-los posteriormente, a isenção pode ser cancelada, e os tributos devidos serão cobrados com os acréscimos legais.
Anistia
A anistia é uma forma pela qual o Estado opta por perdoar infrações tributárias já cometidas, afastando a aplicação de penalidades, principalmente multas. Diferentemente da isenção, que impede o lançamento do tributo em si, a anistia atua sobre as penalidades decorrentes de infrações à legislação tributária.
Enquanto a isenção exclui o crédito tributário relacionado ao tributo, impedindo sua constituição e lançamento, a anistia perdoa as penalidades aplicáveis a infrações já cometidas pelo contribuinte. Em outras palavras, a isenção evita que o tributo seja devido, ao passo que a anistia perdoa a multa resultante de uma infração fiscal.
A anistia está prevista no artigo 180 do Código Tributário Nacional (CTN), que estabelece:
“A anistia abrange exclusivamente as infrações cometidas anteriormente à vigência da lei que a concede, não se aplicando:
I – aos atos qualificados em lei como crimes ou contravenções e aos que, mesmo sem essa qualificação, sejam praticados com dolo, fraude ou simulação pelo sujeito passivo ou por terceiro em benefício daquele;
II – salvo disposição em contrário, às infrações resultantes de conluio entre duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas.”
Condições e Limitações da Anistia
É importante destacar alguns pontos cruciais sobre a anistia:
- Infrações Anteriores: A anistia só pode ser concedida para infrações cometidas antes da vigência da lei que a institui. Isso significa que não se pode anistiar infrações futuras, evitando-se assim o incentivo à prática de infrações.
- Crimes e Contravenções: Não se aplica a anistia a atos que são qualificados em lei como crimes ou contravenções. Portanto, infrações tributárias que também configuram delitos penais não podem ser objeto de anistia tributária.
- Dolo, Fraude ou Simulação: Infrações cometidas com intenção de burlar a lei, por meio de dolo, fraude ou simulação, não são abrangidas pela anistia. O artigo 180, inciso I, do CTN deixa claro que tais práticas não podem ser perdoadas.
- Conluio: Infrações resultantes de conluio entre duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas não são anistiadas, salvo disposição em contrário. Isso está previsto no artigo 180, inciso II, do CTN. O conluio, caracterizado pelo acordo entre partes para cometer infrações, agrava a situação e geralmente impede a concessão da anistia.
Anistia e Infrações Futuras
A anistia não pode ser concedida para infrações futuras. Isso está implícito no fato de que a lei anistia infrações já cometidas. Conceder anistia para infrações futuras seria estimular a violação da legislação tributária, o que contraria os princípios do direito fiscal.
Formas de Concessão da Anistia
A anistia pode ser concedida de forma:
- Geral: Abrangendo todos os contribuintes que se enquadrem nas condições estabelecidas.
- Limitada: Restringindo-se a certas situações ou cumprindo determinados requisitos.
Segundo o artigo 182 do CTN:
“A anistia pode ser concedida em caráter geral ou limitadamente:
I – às infrações da legislação relativa a determinado tributo;
II – às infrações punidas com penalidades pecuniárias até determinado montante, conjugadas ou não com penalidades de outra natureza;
III – a determinada região do território da entidade tributante, em função de condições a ela peculiares;
IV – sob condição do pagamento do tributo no prazo fixado pela lei que a conceder, ou da conversão da pena pecuniária em outra penalidade de menor grau.”
Limitações da Anistia
A lei pode estabelecer limitações na concessão da anistia, como:
- Por Tipo de Infração ou Tributo: A anistia pode ser direcionada apenas a infrações relacionadas a um tributo específico.
- Por Valor da Multa: Pode ser limitada a infrações cuja penalidade pecuniária não exceda determinado montante.
- Por Região Geográfica: Pode ser aplicada apenas em determinadas regiões, em função de condições peculiares, como desastres naturais que dificultem o cumprimento das obrigações tributárias.
- Sob Condições Especiais: A anistia pode ser condicionada ao pagamento do tributo devido dentro de um prazo estabelecido, incentivando a regularização fiscal.
Anistia em Caráter Individual
Quando a anistia é concedida em caráter individual, depende de um requerimento do contribuinte. O artigo 182, parágrafo único, do CTN estabelece:
“Quando concedida em caráter individual, a anistia será efetivada, em cada caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento no qual o interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei para sua concessão.”
Revogação da Anistia
A anistia, especialmente quando concedida em caráter individual, não gera direito adquirido em caso de descumprimento das condições estabelecidas. O artigo 155 do CTN dispõe:
“O despacho que conceder isenção ou anistia em caráter individual não gera direito adquirido, aplicando-se, quando cabível, o disposto no artigo 150, inciso III, alínea ‘b’.”
Assim, se for constatado que o contribuinte não preenchia ou deixou de cumprir os requisitos legais, a anistia pode ser revogada, e as penalidades serão aplicadas com os acréscimos legais.
Anistia e Remissão
É fundamental distinguir entre anistia e remissão:
- Anistia: Impede o lançamento da penalidade pecuniária decorrente de uma infração ainda não constituída em crédito tributário.
- Remissão: Prevista no artigo 172 do CTN, é o perdão do crédito tributário já constituído, seja ele referente a tributos ou multas. A remissão extingue o crédito tributário após o seu lançamento.
Impossibilidade de Anistia após o Lançamento
Tecnicamente, a anistia não pode ser aplicada a penalidades já lançadas, pois sua natureza é impedir o próprio lançamento da multa. Para penalidades já constituídas em crédito tributário, a figura jurídica adequada é a remissão.
Exceções e Aplicações Práticas
Apesar das limitações legais, é comum que leis concedam anistia a multas já lançadas, utilizando o termo “anistia” de forma ampla. Nesses casos, mesmo que tecnicamente seja uma remissão, a legislação pode optar por utilizar o termo anistia, e isso é aceito na prática tributária.